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Coluna

Reviver

01 setembro 2020 - 15h13

Escrevo esta crônica no generoso espaço deste jornal no dia em que a vida, também generosa, sobretudo, considerando o tempo de perdas em que vivemos, me permite celebrar mais um ano de vida. Tal acaso, portanto, não me permite refletir sobre outro tema que não seja a própria vida.

Ouso dizer que nunca tantos de nós estivemos tão próximos da morte. E refletir sobre isso, ao contrário do que possa parecer, não é macabro, sombrio ou pessimista, é valorizar a própria existência e chance de permanecermos vivos. É também, de certa forma, aumentar nossa responsabilidade com os dias renovados e resistentes frente a uma pandemia. Provavelmente, você que me lê agora perdeu ou esteve próximo de perder alguém para este vírus, ou ainda, esteve ou está infectado, atento e cuidadoso quanto à manutenção dos seus amanheceres. E eu te pergunto, estar assim tão perigosamente perto dessa possibilidade é ou não é uma chance de revê-la?

É verdade que todos nós sabemos o nosso fim em comum. A morte é certa. Contudo (e ainda bem!) viver é esquecer de morrer. Mas, repentinamente, um vírus invade a nossa humanidade e nos lembra de que podemos desfalecer a qualquer hora, em qualquer tempo, por qualquer razão. Por mais que haja pesquisas e estatísticas, ninguém está inteiramente seguro de fato, sobretudo, se não entendemos e fazemos a nossa parte prevenindo-nos mutuamente. Ah, sim, este é também e finalmente um tempo para se aprender a empatia, e não, não estou fugindo ao tema: ao que parece, nunca precisamos tanto uns dos outros, mesmo sem a possibilidade de nos ver e tocar como antes. Ou será que sempre precisamos e estávamos dormindo, desacordados?

É sobre vida afinal! Sobre a dádiva de estarmos aqui a despeito de tantas insatisfações, involuções e angústias. É sobre resistir ao vírus, mas resistir também aos vícios, mesmices, egoísmos e injustiças. É sobre aproveitar que a morte bate a nossa porta para escaparmos pela janela da vida, tomarmos novo fôlego e ressignificarmos, reconstruirmos, reavaliarmos, redescobrimos, renascermos, reconhecermos...Re, porque é repetição! E não se trata aqui de monotonia, mas da graça que é acordar todo dia do pequeno sono da morte e “reconstatarmos” que revivemos e estamos de novo recebendo uma chance. Nada de falar mal da rotina só porque ela se repete. Há repetições que nunca nos cansarão. E sobre as que cansam, esgotam e indignam, lutemos para modificá-las. A Chance a que me refiro, integra isso.

Hoje eu resolvi celebrar a minha chance de novo. E se seu aniversário já passou ou ainda não chegou, seja mais criativo do que eu e celebre sem uma razão tão especial. Sem perder a consciência do que fere, sem esquecer a empatia pelo que ao outro aflige. Celebre, inclusive a dor e a tristeza, pois são garantias da sua humanidade. Celebre por e apesar de. Mas celebre, enquanto há chance, enquanto há dias, enquanto há vida.