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Coluna

Maquiagem

04 junho 2022 - 08h00

Ação de disfarçar, camuflar, embelezar, é assim que conceituamos a palavra maquiagem. Essa técnica, assim como os cosméticos, é muita antiga, utilizada desde a pré-história para a prática de rituais xamânicos, cultos funerários e cultos à fertilidade. Mas foi no Egito, há cerca de 3.000 anos a.C., que essa prática se desenvolveu, onde a pintura dos olhos era feita com o objetivo de refletir a alma através dos olhos. Essas pinturas eram feitas com Kohl, um pigmento preto usado como sombra para sublinhar o contorno dos olhos e das sobrancelhas. Também eram utilizadas maquiagens à base de chumbo, malaquita e antimônio.

Foi com o retorno das Cruzadas que a maquiagem se espalhou pela Europa nórdica, quando era utilizada tanto para pintura quanto para rituais. Nas guerras, os guerreiros se pintavam para mostrar força e até mesmo se camuflar nos campos de batalha, um método tão eficaz que, como resultado, é usado até hoje pelos exércitos do mundo todo. Quem não se lembra dos filmes de faroeste, em que os índios se pintavam quando iam guerrear? Aliás, pela pintura do corpo podia-se saber se estavam em guerra ou em paz.

Desde o século XVII, a maquiagem é utilizada por todas as classes sociais. As mais ricas utilizavam preciosidades em suas pinturas, como pó de ouro, prata e pedras preciosas. No Japão, as gueixas usavam batons feitos de pétalas de açafrão esmagadas para pintar as sobrancelhas e bordas dos olhos, e outros pigmentos para o rosto e costas.

Ainda no começo do século XIX, os cosméticos continham o venenoso chumbo, mas os produtos modernos são testados em laboratório e fabricados com recursos neutros, como talco, amido de arroz e caulim, aos quais são adicionados óleos e corantes sintéticos. Hoje é inadmissível um ator ou atriz entrar em cena sem ter passado por um maquiador. Não somente nas artes cênicas, políticos e empresários utilizam a maquiagem quando em apresentação pública, para ter melhor aparência.

Entretanto, quando se fala em maquiagem, não podemos nos esquecer de uma prática muito comum nos dias atuais, que é a maquiagem de produtos e de preços. As novas estratégias para maximização de lucros têm levado as empresas a se reinventarem em busca de mais ganhos. Qual a reação de uma pessoa que recebe de presente um anel embrulhado em papel de jornal? Em que pese o valor do bem, a impressão não seria das melhores. O charme do presente está exatamente na embalagem, uma caixinha revestida de um fino tecido, forrada de cetim, faz um efeito extraordinário. Evidentemente que o custo com a rica embalagem está embutido no preço a ser pago pelo comprador. Técnicos das indústrias de eletrodomésticos trabalham incansavelmente para criar novos designs para os diversos produtos que fabricam, apesar de continuarem exercendo as mesmas funções. Mas o fato é que se tornam mais atraentes e despertam mais atenção dos consumidores.

Algumas empresas, para camuflar preços, alteram o formato e capacidade das embalagens. Uma caixa de sabão em pó que antes continha 1 kg do produto tem hoje apenas 800 gramas; um pacote de biscoitos antes com 20 bolachas hoje tem 18; um pote de requeijão com 250 gramas tem hoje 245, mas sem redução de preço. Parece pouca diferença, porém, em milhares de unidades vai gerar um ganho extra. Tudo legal, pois há a informação no dorso da embalagem, mas o consumidor de certa forma é induzido a pensar diferente.

E os preços expressos com centavos grifados em caracteres diminuídos, tipo 7,99? Ou então anúncios em que o valor da parcela aparece em destaque e o valor do bem em números diminutos? São formas de camuflagem para atrair, ou enganar, o consumidor.

Naturalmente o que os olhos veem transmitem a primeira impressão que vai determinar uma decisão de compra. E isso o marketing aproveita muito bem para provocar vendas. Produtos bem maquiados oferecem maior probabilidade de vendas, e as empresas sabem disso e se aproveitam desse apelo.

Mas além da maquiagem em pessoas e produtos, existe outra modalidade usual na área da administração pública, que consiste em camuflar obras. Obras de fachada, para encantar os olhos, mas que fazem chorar o coração. Como uma rua que recebeu calçamento, meio fio e bueiros e foi inaugurada com toda pompa. Na primeira chuva os bueiros não deram conta, a rua alagou, porque simplesmente não haviam sido ligados a nenhuma rede pluvial; uma estrada dada como asfaltada, mas que teve o piso pintado com piche, dando a aparência de asfalto, e tantas outras ocorrências.

E por que não falar da maquiagem de balanços, quando empresas, através de registros dúbios, encobrem situações que poderiam dar uma imagem diferente da realidade, conseguindo assim melhorar artificialmente os resultados? Um caso clássico foi o que envolveu a Parmalat, considerado um dos maiores escândalos financeiros da Europa em 2003. A empresa que empregava 36 mil pessoas, em 30 países, foi declarada insolvente após terem sido descobertas as fraudes perpetradas em seus balanços, que haviam sido maquiados para apresentarem resultados positivos.

Segundo Albert Einstein (1879 – 1955), físico e teórico alemão, “A realidade é meramente uma ilusão, apesar de ser uma ilusão muito persistente”. Por tudo isso, é bom estar atento, pois “nem tudo que reluz é ouro”.

(*) Clésio Guimarães é empresário, professor, administrador de empresas e representante do CRA-Conselho Regional de Administração.