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Coluna

Calendário

11 janeiro 2021 - 10h38

São 04:55 do dia 31 de dezembro de2020. Perdi o sono e me levanto em busca de um ano. Tento pensar em 2021, mas 2020 está difícil de ir embora. Não por desejo ou uma maior afeição, nunca quis tanto um ano novo, mas há algo ainda não resolvido neste, que ao menos na minha existência, e creio que na de muitos que por ventura me leem, foi absurda e absolutamente diferente de tudo que se espera ou não se espera do calendário. Recordo-me das palavras ditas há poucos dias por uma amiga querida e sábia: “este ano só vai terminar quando estivermos vacinados...” Não todos, porque pasmem, alguns não quererão, porém, ao  menos quando nos for dada a chance ou a escolha. Meus caros, há o inevitável, o inesperado, o involuntário, como talvez tenha sido essa pandemia que nos acometeu, mas há maldades e crueldades que se unem diariamente às nossa tragédias e dramas humanos, há quem torne tudo pior, quando se tem o poder de, ao menos, amenizar, acolher, cuidar...

Estou tentando não politizar minhas palavras, tarefa muito difícil, pois tudo se remete à política visto como nos organizamos e vivemos... Mas é que estou buscando a meninazinha de olhos verdes do décimo segundo andar do ano de Mário Quintana, estou tentando merecer um ano melhor, sendo melhor, como propôs Drummomnd, estou desejando que baste a cada dia o seu mal e que a alegria venha pela manhâ, não sem antes ter vivido uma noite de choros, como nos inspiram os trechos bíblicos. Enquanto escrevo, a luz do dia entra pela janela ao mesmo tempo que a revoada de pássaros que me acompanha desde que me levantei – eu ainda não havia contado a vocês? – silencia. Uma coisa dá lugar a outra, me entristeço por não poder tê-las concomitantemente, me alegro por tê-las cada uma a seu tempo. Copo meio cheio ou meio vazio? Não sou dada a otimismos egóicos ou fugazes, no entanto, não tenho forças para cantar o pessimismo numa virada de ano. Não, este texto não pretende ser elucidativo e, mesmo assim, quase desisto dele, e recorro ao meu gênero mais familiar, só pra ficar mais a vontade com a  falta de sentidos... Mas, é tudo Literatura afinal, e daí se for pessoal demais, subjetivo demais, figurativo demais? Continuo... Minha gata mia já alguns segundos pedindo espaço na janela para o quintal, eu aqui presa às palavras, concedo-lhe, enfim, a liberdade implorada. É tão pouco o que ela me pede, é tão tênue ser livre. 

Volto a pensar em 2021. Tenho mais medos do que antes, será culpa de 2020? Da maturidade, das perdas, das pessoas? Tenho mais necessidade também de acreditar. Acho que já disse, o texto literário tem licença poética pra ser redundante, não é? Como não ter esperança diante da tão grande precisão dela? Me desculpem uma certa melancolia até aqui, talvez já tenha alguém ai pensando que estou sendo cruel demais com 2020. E todos os aprendizados, e as conquistas, a resistência, a coragem, a vida? Mas é por tudo isso também que está difícil se despedir do ano, pelo mal evidente e pelo bem desavisado e até displicente que ele nos trouxe.

Agora já há mais sons por aqui. A maioria ainda dorme, mas o dia já deu sinais de estar acordado. Ainda nem fiz café, ainda não fui lá fora, ainda não terminei as comidinhas da virada, singela e restrita, que celebraremos. Ainda estou em 2020, mas não quero fugir de 2021, tão pouco negligenciá-lo ou temê-lo. Quero esperá-lo, ainda que sem fogos, sem praia, sem multidão vibrando junta, sem vacina. Ainda que aturando e resistindo a quem inescrepulosamente nos governa, ainda que lamentando os vazios deixados pelo ano da pandemia... Quero esperar 2021, mas não passivamente, quero fazê-lo, sê-lo, vivê-lo corajosa e amorosamente com o que virá. Quero fé pra ser 2021. Um pouco de utopia, um tanto de poesia, criticidade, criatividade, e, você! Porque sozinha não vai dar mesmo. Se há espaço para desejar algo depois da lição que tivemos em relação ao 31 de dezembro anterior, que seja mais humanidade, diversidade, fé, direitos, empatia, amor. Ah, sim, saúde coletiva e acessível!

Venha 2021, ainda que carregado de 2020, venha com Deus pra gente dar um jeitinho de viver de novo, com coragem de ser feliz e de ser bom apesar de... Coragem, repito, sem mais preocupação de explicar minhas redundâncias e lembrando o grande Guimarães Rosa: A vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem. 

Vou ali passar um café e esperar companhia, virtual ou não, para os sonhos, para os planos e para a esperança.