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Coluna

A Palmada do Pastor

A mistura entre crença religiosa e política tem se mostrado cada vez mais problemática. A formação de currais eleitorais, de modo direto ou indireto, em paróquias católicas, igrejas evangélicas, terreiros e outros, reforçam uma prática eleitoreira que ope

22 maio 2014 - 14h53
A mistura entre crença religiosa e política tem se mostrado cada vez mais problemática. A formação de currais eleitorais, de modo direto ou indireto, em paróquias católicas, igrejas evangélicas, terreiros e outros, reforçam uma prática eleitoreira que opera na expectativa de mão dupla. Ou seja, de um lado o político atrás de voto a um bom preço, do outro, autoridades religiosas que anseiam estar próximas ao poder e desfrutar das suas benesses. Ah, ainda tem o rebanho eleitor, que vai orar fervorosamente por algum cargo ou vantagem que sobrar no meio dessa história. 
O problema, no entanto, tornou-se mais grave. Muitas comunidades religiosas, em especial as chamadas pentecostais e neopentecostais, perceberam que é mais vantajoso suprimir o político como intermediário e ter seus próprios candidatos “ungidos” para exercer mandatos. Desse modo, ao contrário do que se espera de um político, ou seja a defesa dos temas que afligem seriamente a sociedade, em geral os mandatários se prendem à defesa intransigente de aspectos estritamente dogmáticos e interessantes apenas aos grupos que os sustentam no poder. Não surpreende também a muitos que esses mesmos mandatos estejam vinculados ao grande e lucrativo negócio da evangelização pós-moderna.
Exemplo disso foi a polêmica passagem do pastor Marcos Feliciano (PSC-SP) pela Comissão de Direitos Humanos, cuja atuação milimetricamente ensaiada, em nada contribuiu a não ser para polemizar de modo agressivo contra todos que, em tese, a própria comissão deveria proteger. Agora, mais recentemente, o Deputado Pastor Eurico (PSB-PE) hostilizou gratuitamente a apresentadora Xuxa, presente como convidada na CCJ da Câmara, na discussão do projeto que ficou conhecido como “Lei da Palmada”, que proíbe os pais ou responsáveis de baterem em seus filhos menores. Ou seja, um belo exemplo de avanço civilizacional, que nos obriga a evoluir para uma educação que não seja baseada na violência assimétrica entre adultos e crianças.
A “palmada” do pastor em sua fala, acusou a apresentadora de “agressora de menores” em virtude de um filme de conteúdo sensual no qual a mesma foi uma das protagonistas em 1982 (em uma das cenas sensuais a jovem Xuxa contracena com um adolescente). Mas o pastor se esquece que muitos dos seus pares, políticos ou não, tiveram uma vida pregressa questionável antes da “conversão”. E nessas fileiras se encontram ex-traficantes, ex-assassinos, ex-sequestradores, ex-viciados em tudo o que se possa imaginar, ex-pedófilos, ex-espacandores de mulheres, ex-corruptos, e por aí. A lista é longa. Ora, se a ação isolada de uma pessoa no passado a define pelo resto da sua vida, então os que comungam da fé do pastor-político deveriam jogar a toalha também. O perdão divino e o perdão social, quando dados ou conquistados, oferecem a pessoa vida nova. E isso é um dos traços mais sublimes de qualquer fé, a capacidade de recomeçar e se estruturar como uma pessoa de bem, de boas idéias e ações. 
Muitos podem argumentar que esses pastores-políticos não representam o chamado “meio evangélico”. Entretanto, se elegem através dele e falam em seu nome. Sendo assim, ou esse meio deve rever em quem vota, ou ajudar a sociedade a descredenciá-los como seus interlocutores perante a opinião pública. Porém as mensagens intolerantes de apoio às trapalhadas dessas lideranças, parecem confirmar nossos piores temores. Ou seja, a cada eleição o quadro se torna mais sinistro. 
Em tempo, os deputados da “bancada evangélica” presentes na comissão, o que inclui seu porta-voz, Pastor Eurico (que curiosamente pertence a um partido “socialista”), são contrários ao projeto que protege os menores da violência doméstica, manobrando para adiá-lo mais uma vez. Enquanto isso, o intrépido pastor-socialista e deputado, vai cuidando da reapresentação do seu projeto de “Cura Gay”.