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Coluna

A liberdade em espera

O dia 13 de maio é uma data que nos impõe uma reflexão. Último país a abolir a escravidão de africanos, o Brasil, como todos os demais países escravocratas, arrasta profundas dificuldades para se reconciliar com um passado de exploração e um presente de p

15 maio 2014 - 21h26

O dia 13 de maio é uma data que nos impõe uma reflexão. Último país a abolir a escravidão de africanos, o Brasil, como todos os demais países escravocratas, arrasta profundas dificuldades para se reconciliar com um passado de exploração e um presente de preconceitos concretos.

Os antepassados dos afro-descendentes não vieram parar aqui a passeio. Vieram amontoados, de cócoras, preso a ferros em porões de navios. Como uma carga qualquer, muitos deles pereciam penosamente nessas travessias. Já em terra, a sorte também não lhes favorecia. Numa estrutura disposta a não lhes considerarem como pessoas, foram subjugados culturalmente, economicamente e socialmente. Séculos nessa condição, aliado aos muitos que aqui desembarcaram, só poderia ter como resultado o preconceito estrutural, que atravessa a longa duração do tempo histórico e chega aos dias atuais.

E não nos surpreende que, ainda hoje, toda a vez que se executa alguma ação em favor dos que foram historicamente empobrecidos e marginalizados, se levantam aos berros as vozes incoerentes. Essas mesmas vozes alegam que o problema no Brasil é social e não racial. É claro que isso é uma fala típica do branco de classe média ou alta. Certamente o problema maior que une a todos os empobrecidos é social, econômico e político. Mas é ainda pior para o negro que está nessa condição, já que a tudo isso se acrescenta o quesito cor.

Ainda se fala do negro com menosprezo, deboche, com marcadores sociais de subalternidade. A religião que descende das senzalas é amplamente demonizada, bem como todos os demais referentes que envolvem, cânticos, danças, lendas e histórias. A beleza comercialmente explorada como referência é branca. Assim como a maior parte dos nossos personagens, das bonecas, das apresentadoras de televisão, dos protagonistas das telenovelas. E também dos magistrados, empresários, ministros, profissionais liberais, e todos os demais que conseguem os espaços vedados aos que trazem consigo o duplo marcador social e racial.

Ao contrário do que pensam os apressados, as políticas afirmativas não endossam a desigualdade, instaurando um país intolerante. Esse argumento é falso e hipócrita. Primeiro porque se baseia no surrado mito da “democracia racial”, uma distorção do século passado. Em segundo, porque deseja que desiguais sejam tratados igualmente. Ou seja, acredita-se que qualquer um pode conseguir o que deseja, mesmo partindo de condições inversamente proporcionais. Coisas da carochinha, ou do Tio Sam...

Ainda assim, há esperança porque mesmo nos comentários mais estapafúrdios sobre o tema, encontramos algo consensual. O reconhecimento do problema a que estão imersos os afro-descendentes (mesmo ignorando-se o quesito cor), e de que são urgentes e necessárias medidas permanentes que possam melhorar a condição de vida e cidadania das pessoas.

Só não podemos esquecer que, além de tudo isso, existe o mal maior do preconceito. Porque sem exorcizar esse, que é o verdadeiro demônio contemporâneo, nenhuma das melhorias consistentes chegarão a quem mais dela necessitam.