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Coluna

Se votar

01 outubro 2022 - 12h47

Se por um acaso você acha que do seu voto depende a purificação da sociedade por meio de uma moral que só funciona na imaginação daqueles que sequer a praticam. Se pensa que como eleitor você se tornou um cruzado de alguma igreja beligerante. Se considera que votar é uma garantia daquele emprego no qual você finge que trabalha, finge que é produtivo e cujos resultados você finge que é relevante. Se sabe que seu candidato usa uma função eletiva como ponte para outras eleições, cacifando os votos que atrairão os “investimentos” para as outras etapas.

Se pensa que todos os candidatos são farinha do mesmo saco e que tanto faz votar em qualquer um. Se você anula seu voto. Se você vota em branco. Se finge não saber que o seu “fechamento” vem de um berço de ilegalidades. Se acredita que votar é o mesmo que encontrar um salvador ou salvadora. Se ilude as outras pessoas vendendo um candidato que, na verdade, só a você interessa por benefícios nada republicanos. Se você ao invés de militante se torna um puxa-saco. Se municia seu voto com ódio, preconceitos e racismo achando que isso é liberdade de expressão. Se confunde a sua derrota eleitoral com conspiração.

Se acha que seu político é um santo e que todos os que o investigam são demônios. Se normaliza as barbáries do seu candidato. Se vendeu seu voto por cinquenta, cem, milhares ou milhões de reais. Se vendeu a sua alma. Se vendeu o seu corpo. Se vendeu a sua consciência. Se perdeu a vergonha e despudoradamente defende o indefensável.

Se vota porque o candidato é gente boa. Vota pela beleza ou pela fama. Vota porque achou engraçado. Vota sem entender que dessa ação depende o preço do feijão, da carne, da gasolina. Vota porque te arrumaram aquela cirurgia. Vota porque te passaram na frente do atendimento do postinho. Vota por vingança. Vota por medo.

Acha normal que políticos usem a coisa pública para perseguir adversários. Se ergue a bandeira de alguém cuja evolução patrimonial você não conhece. E se conhece, inveja não ser você no lugar – por enquanto. Se nem sequer lembra em quem votou anteriormente. Se não faz a menor ideia da proposta dos seus candidatos. Se o candidato te chama de irmão e você acredita. Se considera prestígio um candidato comer da sua comida, forçando uma intimidade que só existe no seu sonho. Se o seu candidato faz cara feia comendo pastel. Se faz cara feia depois de eleito. Se você vota achando que depois da eleição o candidato te guardou na memória, ou tem aquele compromisso especial com você.

Se você pensa que votar não adianta. Se você já tem planos para não votar. Se vota naqueles que outro eleito quer ou manda. Se acha que pertence a uma família política só por ser um capacho útil. Se pensa que a política não é lugar para o mérito, para a honestidade e para a inteligência. Se vota pelo cimento. Se vota pela conta de luz quitada. Se vota em qualquer um, por desgosto. Se vota no primeiro santinho jogado na rua no dia da eleição. Se seu candidato é um cadáver político insepulto. Se acredita em vídeo de WhatsApp. Se seu eleito é um cavalo de troia de outros políticos desprezados.

Se acha que só os seus são “de bem”. Se experimentará o sadomasoquismo de votar novamente em quem te enganou recentemente, ou antigamente, ou a pedido de quem também te decepcionou.

Repense. Mas se até aqui você leu e não se reconheceu nessas linhas, boa eleição e obrigado por ajudar a construir uma sociedade melhor.

(*) Paulo Cotias é professor de História.