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Coluna

Quando eu me apaixonei por Chico Buarque

25 janeiro 2021 - 12h40

Era dezembro de 1972. Tinha eu lá meus 10 anos e todos os sonhos do mundo. Num dia qualquer deste verão fui pega de surpresa com um beijo roubado. Um beijo rápido, selado, apressado... Não sabíamos ainda o que fazer com a língua. Mas que valeu a pena por ter sido dado pelo garoto que eu amava. Nunca subestimem o amor de uma pessoa aos 10 anos.

Passado um tempo, mas nem tanto, meu irmão chegou em casa com um disco novo. Ele amava música e gastava uma grana comprando LPs. Em casa todos gostavam de música, talvez inspirados por minha mãe, pessoa de voz afinada e repertório impecável. Acordar com ela cantarolando era divino porque nos avisava, de alguma forma, que tudo estava bem. Mas voltando à nova aquisição do meu irmão, lembro-me bem de ouvir uma faixa que adorava. Chamavase “A Banda”. Era uma regravação do próprio autor devido ao grande sucesso em outra época. A música me remetia as histórias contadas por minha mãe sobre meu avô que tocava bombardino numa Banda no interior de Minas, onde moravam. Ela dizia que ele não vivia sem a música, sem a Banda, sem o seu bombardino. Já aposentado, passava horas do dia lustrando o instrumento. Portanto, ouvir o verso “Pra ver a Banda passar tocando coisas de amor...” era como se quem fez a música conhecesse a nossa história. Perguntei ao meu irmão quem era “esse Chico”. Apesar de ouvir suas informações, não contente ainda, roubei-lhe o disco. Começava ali minha grande história platônica de amor.

Foi com Chico, num disco cujo título é Meus Caros Amigos que comecei a ter uma certa noção sobre o que acontecia no Brasil. O que poderia de tão grave afastar tão grandes amigos? Além da música que dá nome ao disco e fala claramente sobre o exílio, Mulheres de Atenas me despertou o interesse sobre história. Lembro de propor para uma professora na escola um estudo sobre Atenas, a Grécia, sua Cultura... Eu falava de Chico como se fôssemos íntimos. Em época de discotecas, músicas americanas dominando o mercado fonográfico brasileiro, meus amigos me achavam doida e o Chico um chato!

A flechada certeira foram as composições feitas no feminino, falando com propriedade feminina, sobre sentimentos femininos. Aí tive orgasmos! Chico era completo e único! O homem que falava para a mulher coisas que só a mulher sabia. E que inveja da Marieta! Da Beatriz, da Joana, da Luzia, da Ana, da Rita, da Renata e de tantas outras...

Me apaixonei por Chico Buarque quando vi os seus olhos naquele LP roubado do irmão. Quando ouvi sua música e sua voz que tantos diziam não ser afinada... Me apaixonei por Chico quase que como pelo meu primeiro amor naquele verão de 72, depois de um beijo roubado. Só que diferente daquele, esse eu nunca esqueci.