Depois de uma batalha de mais de 20 anos, todos os 11 quiosqueiros que ainda ocupam a Praia das Conchas, em Cabo Frio, terão que desocupar as estruturas entre os próximos dias 15 e 22 deste mês. Em uma nova notificação à Prefeitura, feita através de ordem judicial, o Ministério Público Federal (MPF) determinou que todas as áreas ainda construídas sejam demolidas até o próximo dia 30 de abril.
Em vídeo que circula nas redes sociais, o proprietário do quiosque Tia Maria, Ernani Gomes, contou que trabalha no local há 53 anos, e que a estrutura de concreto que existe hoje foi erguida no final do primeiro ano do governo do ex-prefeito Ivo Saldanha.
– Começamos com quatro varinhas de bambu, depois virou barraquinha, trailer, e quando chegou em 1989 para 1990 houve a mudança para quiosque - contou.
Não só para os funcionários, mas também para os proprietários, o local se tornou a única fonte de renda ao longo dos últimos 50 anos. Alguns quiosques, como o Lourival, passaram de pai para filho. Hoje ele é administrado por Douglas Ribeiro, que tem quatro funcionários com carteira assinada.
– Estamos na batalha há mais de 40 anos, e agora vem essa situação, da gente ser retirado dos quiosques. Estamos nos sentindo desamparados - contou.
O representante do deputado estadual Flávio Serafini (PSOL), Lucas Muller, lamentou que a demolição dos últimos quiosques na Praia das Conchas esteja marcada para a véspera do Dia do Trabalhador. Segundo ele, há mais de um ano o governo municipal de Cabo Frio vem prometendo soluções, “mas não toma nenhuma medida concreta”. Segundo ele, essas demolições ainda podem ser evitadas pela Prefeitura.
– Há solução para o caso: basta a Prefeitura requerer a área de trás dos quiosques - proposto pela própria Advocacia Geral da União (AGU) - e um novo projeto para os novos quiosques, como Búzios fez na Praia das Tartarugas. Queremos uma solução diante dessa covardia/incerteza às famílias de 150 trabalhadores da Praia das Conchas. Caso mais uma vez haja descaso, no dia 30 haverá grande resistência popular e mobilização - anunciou nas redes sociais. A Folha não conseguiu confirmar com a AGU se houve, e quando houve, essa proposta citada por Lucas.
Apesar da apreensão, no fim da tarde desta quinta-feira (11) a Prefeitura de Cabo Frio anunciou um acordo com os advogados que representam os quiosques: eles terão suas atividades transferidas para a faixa de areia da Praia das Conchas. Os moldes de atuação comercial dos quiosqueiros na praia, como quantidade de kits de mesas e guarda-sóis e padronização, ainda serão definidos pela Prefeitura. A ideia é que os espaços sejam utilizados de forma ordenada e sem causar desassistência aos comerciantes.
A ação de demolição dos quiosques teve início há mais de 20 anos. Nela a União pede a retirada de todas as construções da orla da Praia das Conchas. Em 2016 a Justiça Federal condenou a Prefeitura de Cabo Frio a iniciar as demolições. O processo, no entanto, foi se arrastando por anos, com cada proprietário recorrendo da decisão de forma individual.
Somente três anos depois aconteceram as primeiras demolições: o quiosque de nº13, conhecido como Maré Alta, foi o primeiro a ser derrubado em 2019. Em 2020 outros três foram demolidos, e mais dois em 2021. No entanto, o advogado que representava 12 dos 17 donos de quiosques na Praia das Conchas, Carlos André Teles, garantiu à Folha, na época, que as demolições de 2020 foram ilegais: “Em todos os casos, as ações ainda corriam na Justiça Federal sem uma decisão definitiva” - contou. Desde então, outros 11 quiosques seguiam em contestação judicial.
Segundo a Prefeitura, após receber a nova ordem judicial, foi elaborado um cronograma, que teve início no último dia 1º com a notificação de todos os quiosqueiros. No último dia 8 foi feita uma primeira fiscalização no local pela equipe do governo municipal e concluído o estudo referente à demolição e retirada dos escombros.
Nesta segunda (15) começa oficialmente o prazo para os proprietários desocuparem todos os quiosques, incluindo móveis, objetos e pertences pessoais. O prazo termina no dia 22 deste mês, e no dia 30 acontecerá uma operação conjunta das Secretarias de Obras, Meio Ambiente, Segurança, Guarda Municipal, Procuradoria, Desenvolvimento Urbano, com participação de membros do MPF, PM e Inea para operacionalização da demolição.
– Quando assumiu o governo, a prefeita Magdala Furtado tentou um novo prazo, mas após a passagem do verão essa foi a data final que nos foi dada. É bom esclarecermos que não é uma ação em que a Prefeitura de Cabo Frio pode interpelar, mas apenas cumprir essa ordem judicial. Estamos cumprindo o cronograma etapa por etapa, com antecedência, para que todos os responsáveis dos quiosques possam se organizar e fazer a retirada dos seus pertences - informou o secretário de Obras e Serviços Públicos, Carlos Augusto Gonçalves.