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ENTREVISTA

Pré-candidato, Rafael Peçanha critica falta de diálogo do governo

"Não posso concordar que direitos sejam retirados dos servidores", disse em entrevista à Folha

30 junho 2023 - 08h30Por Cristiane Zotich
Pré-candidato, Rafael Peçanha critica falta de diálogo do governo

A corrida eleitoral pela cadeira de prefeito de Cabo Frio em 2024 ganhou mais um nome: o do ex-vereador e atual secretário adjunto de Ciência e Tecnologia, Rafael Peçanha (PT). A notícia já havia sido antecipada pela Folha há cerca de 15 dias, em notinha publicada pelo jornalista Moacir Cabral na coluna Informe. Esta semana, em entrevista ao jornal, Peçanha falou sobre os planos que possui para Cabo Frio e destacou que o diálogo faz parte disso. Foi nesse ponto, aliás, que o pré-candidato teceu duras críticas ao atual prefeito, José Bonifácio (PDT).
–  A lei nacional do piso salarial da educação, que é federal, foi cumprida, mas a municipal [PCCR], que coloca uma espécie de escalonamento entre as classes, não. O PCCR do servidor municipal, que trata do reajuste anual em abril, também não foi cumprido. Eu não posso, fazendo parte do governo ou não, sendo professor, servidor público concursado, sindicalista e membro do Partidos dos Trabalhadores, concordar com isso. Faltou e falta diálogo – avaliou.
Na conversa, Rafael também falou sobre os reais motivos que o fizeram abrir mão da candidatura à prefeitura em 2020, sobre os motivos que o levaram a trocar o PDT pelo PT e também sobre um suposto boicote que estaria sofrendo dentro do governo em que  é secretário.
–  Não acredito que isso tenha acontecido, até porque seria muita pequenez, infantilidade e, acima de tudo, falta de inteligência política, gastar tempo e estrutura pública para boicotar a divulgação das minhas ações. A população de Cabo Frio sabe quem eu sou e conhece meu trabalho. Nesse caso, eu deixaria para os boicotadores o desespero desonrado, e até engraçado, da disputa de links e likes, enquanto eu prefiro trabalhar e estar nas ruas.

Folha - Em 2020 você viria candidato a prefeito, mas desistiu alegando motivos de saúde. Como está sua saúde hoje? O problema que você tinha em 2020 já foi resolvido?
Rafael -
Em 2020 eu passei por um processo que foi um acúmulo de coisas de seis anos. Eu comecei a me preparar para ser candidato a vereador logo após a eleição de 2014. Ganhamos a eleição, fiz um mandato bastante combativo e ativo, mas acho que me desgastei demais. O meu tempo, minha saúde e minha família ficaram em segundo plano, e o efeito colateral disso foi o desgaste físico, mental e psicológico, que foi acumulando. Em 2020 eu já me sentia fisicamente desgastado: tive dois desmaios, que na época preferi não expor. Nos exames apareceu uma cardiopatia, diabetes, meu fígado estava consumido por uma esteatose bastante grave. E ainda tinha a obesidade e uma série de comorbidades. E o conjunto de todos esses fatores me fez colocar o pé no freio porque estava indo com muita sede ao pote, me dedicando demais ao processo. Precisei parar, embora fosse um momento muito favorável pra mim, politicamente, porque estava indo bem nas pesquisas, mas tomei uma decisão que, acredito, foi bastante corajosa. Acho que foi o maior ato de coragem que eu tive na vida, de abandonar um caminho bem traçado rumo à Prefeitura de Cabo Frio em prol da minha família, da minha saúde, da minha mente. Não me arrependo e tenho muito orgulho disso. De lá pra cá a gente vem tratando. Hoje eu tomo medicação controlada, mas tô em dívida com meu cardiologista, preciso voltar (risos). Mas consegui criar uma rotina de organização, de atenção à família, de amadurecimento mental, psicológico e emocional, de encaixe das medicações, e hoje tenho todas essas comorbidades controladas. Hoje eu me sinto preparado como não estava em 2020.

Folha - Você começou sua vida política no PDT, mas acabou deixando o partido e indo para o PT. Vai concorrer à prefeitura pelo PT mesmo ou voltar para o PDT?
Rafael -
Nossa pré-candidatura é pelo PT. Precisamos obedecer prazos eleitorais, discussões internas do partido e da federação, que hoje é formada por PT, PV e PC do B. Se nosso nome for escolhido, será como candidato a prefeito de Cabo Frio pelo PT. Não existe nenhuma conversa em direção a outra legenda. O PDT é um partido que eu tenho imensa gratidão e carinho, e sei que muitas pessoas do partido têm esse sentimento por mim também. Mas dei esse passo em direção ao PT por me identificar mais ideologicamente.

Folha - Em 2020 Aquiles Barreto abriu mão da candidatura para apoiar Bonifácio em troca de ser o candidato dele em 2024. Acontece que você também vem sendo apontado como um nome que pode ter o apoio do prefeito. Você e Zé já conversaram sobre isso, sobre ele te apoiar?
Rafael -
Não tive nenhuma conversa com o prefeito sobre a questão da pré-candidatura. Teremos o prazer de receber o apoio de todos os partidos que joguem no nosso campo progressista, da esquerda, centro esquerda… E lógico que o governo municipal e o PDT fazem parte deste campo. Então, vai ser um prazer a gente receber esse apoio do governo ou de outros partidos e outros grupos, mas a gente ainda não tem essa conversa nessa direção. Vamos buscar esses apoios, gostaríamos de receber esses apoios. Mas o PT vai ter candidatura própria em 2024 tendo esses apoios, inclusive do governo, ou não.

Folha - No início do governo houve um clamor muito grande para você assumir a secretaria de Educação, mas Zé te colocou na Ciência e Tecnologia. De alguma forma isso te frustrou?
Rafael -
Não me frustrou porque eu não tinha condições de assumir uma secretaria, como a de Educação, naquele momento. Eu tinha abandonado uma candidatura bastante viável para prefeitura exatamente por entender que minhas condições física, familiar e psicológica não me davam essa condição. Assumir uma secretaria de Educação, do tamanho que ela é, com a complexidade que ela tem, não faria nenhum sentido. Desde o começo deixei isso muito claro, e quando Zé me apresentou a secretaria adjunta de Ciência e Tecnologia, eu fiquei bastante feliz porque é uma área que tem bastante a ver com minha formação acadêmica, e eu sempre tive um trâmite muito bom com as universidades, os reitores, com o universo científico. É algo que combinava com a história que eu construí profissionalmente e que me dava uma carga não tão intensa (política e de articulação). Então não me frustrou em nada.

Folha - Algumas pessoas de dentro do governo dizem que você está sendo boicotado, e que suas ações não estão sendo divulgadas como deveriam. Você se sentiu boicotado em algum momento pelo governo?
Rafael -
Eu não tenho nenhuma informação sobre boicote e, pra ser sincero, nem reflito muito sobre isso porque vejo a política de uma maneira diferente, e a história de Cabo Frio mostra isso: a população valoriza quem ela confia, quem ela vê falando e sente que é verdade, ela valoriza quem faz as coisas, quem produz. A população reconhece quem tem seriedade e quem não tem. Vejo personagens políticos que divulgam muito, que aparecem muito, aparecem em muita foto, muita reportagem, muitos sites, mas não têm a confiança da população. Mas não acredito que isso tenha acontecido até porque seria muita pequenez, infantilidade e, acima de tudo, falta de inteligência política, gastar tempo e estrutura pública para boicotar a divulgação das minhas ações. A população de Cabo Frio sabe quem eu sou e conhece meu trabalho. Nesse caso, eu deixaria para os boicotadores o desespero desonrado, e até engraçado, da disputa de links e likes, enquanto eu prefiro trabalhar e estar nas ruas.

Folha - Qual avaliação você faz do governo Bonifácio? Quais os pontos positivos e os negativos?
Rafael -
Como todos os outros, acho que ele errou e acertou. Mas acho que alguns problemas são fundamentais que sejam pensados. Hoje, por exemplo, temos o caso dos profissionais de educação e dos servidores municipais. Os problemas estão, principalmente, nos detalhes. A gente teve, por exemplo, a lei nacional do piso salarial da educação, onde houve a adequação de algumas classes que estavam de fora para que passassem a ganhar dentro do piso: ou seja, a lei federal foi cumprida, mas a municipal [PCCR], que coloca uma espécie de escalonamento entre as classes, não. Já o PCCR do servidor municipal tem a questão da data base, que é o reajuste anual, sempre em abril, com percentual, de preferência, sempre acima da inflação, para que seja realmente um reajuste, e não uma recomposição salarial: isso também não foi cumprido. Então eu não posso, fazendo parte do governo ou não, sendo professor, servidor público concursado, sindicalista e membro do Partidos dos Trabalhadores, concordar com isso. É uma falha que precisa ser corrigida porque não está correto. É claro que existem as questões fiscais e financeiras do governo, mas temos uma boa arrecadação, temos instrumentos da legislação federal do piso nacional que prevê que a União pode ajudar na equiparação dos pisos. Mas o governo teve, e tem, muitos acertos. O Zé tem feito uma coisa muito importante, e que às vezes não aparece aos olhos das pessoas, que é a reorganização financeira do município, da gestão fiscal municipal. Quando vereador, sempre acompanhei muitos precatórios, muitas dívidas, e o governo tem trabalhado para sanar os problemas financeiros do município. E isso leva tempo, mesmo com a arrecadação melhorando. Na educação eu preciso destacar a reforma das escolas. No caso do servidor, apesar das críticas que eu fiz, tem que se destacar que voltou a pagar em dia. “Ah, mas pagar em dia é obrigação”. Claro que é, mas diante dos sinais de instabilidade que a gente tinha, até aquilo que é óbvio passa a ser um avanço. Acho que Cabo Frio precisa abraçar as conquistas que aconteceram nesse governo, não as jogar fora nas próximas gestões, trabalhar para que elas se aprofundem e avancem cada vez mais, e consertar os erros. Não podemos endeusar nem demonizar gestões. Acho que a palavra é avançar.

Folha - Você é professor. Como o Rafael Peçanha prefeito trataria essa questão do PCCR da Educação?
Rafael -
Acho que o diálogo seria maior. Como vereador eu fiz isso: ouvi a categoria, ouvi os representantes sindicais (e eu também sou sindicalizado), apresentava a situação da Câmara, do município, até porque nem sempre a situação era favorável ao que nossa categoria desejava, mas era apresentada, havia diálogo. E mesmo que a solução e as possibilidades não estivessem de acordo com o que o movimento e a categoria queriam, a realidade era colocada. O que falta hoje é diálogo. Além dessas questões que critiquei antes, nós tivemos uma mudança no PCCR para que os profissionais de educação (servidores do novo concurso) não tivessem os mesmos direitos do que os anteriores tinham. Foi abolida, por exemplo, a licença prêmio. Nem sei se juridicamente isso pode existir (uma categoria dividida entre pessoas que entraram antes da lei e uma outra que entrou depois da lei), ou seja, os novos concursados que entram têm menos direitos que os outros. Eu não posso ser a favor da retirada de direitos da categoria. Em todos esses casos acho que faltou diálogo: “Olha, nós vamos ter dificuldades em cumprir determinados procedimentos porque estamos com problemas fiscais ou financeiros”, e mostrar: “Olha, é isso aqui, essa é a condição financeira do município, e temos dificuldade nisso, mas talvez daqui a dois meses a gente consiga, vamos criar esse compromisso? Vamos, todos os meses, fazer isso juntos?” Quando fui vereador, teve uma vez que conseguimos montar uma comissão junto com representantes sindicais, e íamos todos os meses na secretaria de Fazenda, mesmo eu sendo oposição ao governo, para analisar extratos, prestações de contas e verificar a situação do município dentro das possibilidades de pagamento. Então, eu dialogaria, tomaria mais decisões em conjunto e tentaria avançar nessa direção, com consciência da realidade financeira, mas sabendo que o diálogo resolve grande parte dos problemas que acontecem.

Folha - Acha que pra eleição de 2024 vai ser bom ou ruim levar na bagagem o fato de ter sido um secretário do governo Bonifácio?
Rafael
- Isso não me preocupa. Assumi uma gestão e ainda sigo nela. Procuro fazer de forma equilibrada e coerente, sem distanciamento entre grupos políticos, de forma técnica… E assumo meus posicionamentos: apoiei Zé na eleição e retirei minha candidatura; aceitei ser secretário e promover políticas públicas para o município. Não acho que seja um peso, ou ruim, mas também não acho que seja decisivo. É apenas um componente em uma história de quem teve uma eleição de vereador com quase 1.800 votos na primeira tentativa, foi líder da oposição de dois governos na Câmara, sempre lutou pelas mesmas causas, nunca aceitou negociatas; uma história de quem foi candidato a prefeito, em cima da hora, em uma eleição extemporânea, e teve 14 mil votos; uma história de quem foi para o Partido dos Trabalhadores em um momento difícil, principalmente na região, e que ajudou na coordenação da campanha do presidente Lula, colocando 40.668 votos em Cabo Frio… Dentro dessa história, um dos capítulos é ser secretário no atual governo. É uma experiência no Executivo que faltava pra mim, e que me prepara melhor para ser candidato a prefeito lá na frente.

Folha - Você já foi vereador. Acha que essa experiência pode te ajudar a comandar a prefeitura? De que forma?
Rafael -
Ajuda muito. Não foi um mandato só pra cumprir tempo, foi algo muito dedicado. Eu me debrucei muito sobre o orçamento do município, da Câmara Municipal, sobre as legislações internas da Câmara, sobre direitos da população, direitos políticos, relação com o Ministério Público… Aprendi bastante ali, e acho que essa experiência é complementada pela atual experiência do Executivo, porque no Legislativo a gente tem a função de fiscalizar, de fazer propostas de políticas públicas, mas faltava a experiência de como saber executar essas políticas, como transformar essas propostas em prática, em realidade. Acho que chego mais amadurecido, mais completo, com mais conhecimento, mais equilibrado, mais focado e mais pronto para ser prefeito de Cabo Frio.

Folha - Quais seriam suas prioridades como prefeito de Cabo Frio?
Rafael -
Atuar diretamente na questão econômica do município, e aí a gente está falando de várias coisas, principalmente de fazer a economia girar nas mãos da população. A gente tem elementos muito positivos atualmente, como a moeda social, que é uma criação do PT, foi trazida para Cabo Frio, e faz o giro da economia principalmente nos bairros menos favorecidos. Isso a gente tem que manter e ampliar. Para gerar mais empregos tem que atrair mais indústrias limpas e empresas. Temos uma legislação municipal pronta para isso, como São Pedro tem, basta executar e criar um grupo que corra atrás desses investidores. Precisamos valorizar o servidor para que ele tenha poder de compra e possa movimentar o nosso comércio. Precisamos investir no turismo como fonte de renda para que Cabo Frio seja conhecida em todas as partes do país e do mundo, recebendo turistas que realmente queiram contribuir com nosso município sem prejudicar nossas belezas naturais. Precisamos investir em educação para que ela movimente a economia e faça com que as pessoas mais pobres tenham acesso ao ensino, à formação e à empregabilidade, aqui e fora da cidade. Temos que investir em um plano arrojado e muito agudo para tirar as pessoas da situação de pobreza e miséria da nossa cidade. Temos cerca de 30 mil pessoas na linha de pobreza em Cabo Frio, e elas precisam de emprego, de formação, mas antes de tudo de sobrevivência: precisam comer hoje, amanhã e todos os dias.

Folha - Como as pessoas têm recebido sua pré-candidatura?
Rafael -
Eu queria deixar uma palavra de gratidão. Onde vou sou bem recebido. Tenho conversado, recebido sugestões, as críticas também são bem-vindas. Nem imaginaria que a ideia seria tão bem recebida. Isso me deixa feliz e animado para continuar e retomar uma estrada em defesa da cidade de Cabo Frio, muito mais conhecedor dos nossos problemas. Estou pronto para levantar a taça junto com o povo.