GABRIEL TINOCO, RODRIGO BRANCO E NICIA CARVALHO
A rapper Taz Mureb e mais cinco manifestantes foram presos e agredidos na manhã de ontem na Praça Tiradentes, em frente à prefeitura de Cabo Frio, onde acampavam há 13 dias em protesto contra o não pagamento do Proedi (Programa Municipal de Editais de Fomento e Difusão Cultural). O pivô da confusão foi a utilização de uma piscina de plástico com uma placa onde estava escrito: “Riala, só voltou à ativa quando o prefeito voltou”.
Fiscais da Postura e guardas municipais foram mobilizados para cumprir ordem para retirar a piscina, mas, a partir daí, o clima ficou tenso, com discussões acaloradas. Sem acordo, foi solicitada a presença da Polícia Militar, que enviou cinco viaturas. Líder do movimento, Taz Mureb continuou resistindo, mas o desfecho não foi nada agradável. Os PMs utilizaram da força bruta, mesmo com a rapper já rendida. Ao ser imobilizada, eis o diálogo:
– Não me encosta, me algema, mas não me encosta – gritava ela, numa demonstração de que não oferecia qualquer resistência. Mesmo assim, recebeu um jato de spray de pimenta no rosto: “Olha isso! Spray de pimenta na minha cara”, protestava (o vídeo pode ser conferido no Facebook da Folha dos Lagos).
Um policial não identificado fez o seguinte o comentário: “Agora ela vai ficar calminha”.
A cantora foi levada para a UPA do Parque Burle, onde foi medicada e, em seguida, levada à 126ª DP (Cabo Frio) para prestar depoimento.
Taz Mureb prestou depoimento acompanhada pela família e por um advogado. Ela apresentava pele avermelhada e com a voz em tom alterado.
Depois, em sua página pessoal no Facebook, Taz Mureb desabafou e disse que foi maltratada dentro da delegacia. “Jogaram spray de pimenta no meu rosto. Tive duas convulsões e os policiais ficaram rindo da minha cara”, contou ela, na postagem.
Ao falar com a Folha a delegada adotou postura cautelosa, mas disse que Taz “estava visivelmente alterada” e que “o uso de força moderada pode ser necessária numa operação policial”.
– A Taz vai assinar um termo circunstancial, será autuada por desacato e vai ser liberada – declarou a titular da delegacia.
Além de Taz Mureb, mais cinco manifestantes foram levados para a delegacia: Thiago Ayrton (conhecido como Kaykky Lima), Diogo Rodrigues, Otávio Augusto (o Feijão), Jordy Lorran e Paulo Henrique. Eles chegaram por volta das 12h e cinco deles só saíram por volta das 18h. Diogo ficou por mais tempo e só foi liberado pouco depois das 19h30.Após ser liberada, Taz foi ao 25º BPM (Cabo Frio) prestar queixa contra os policiais militares.
A professora Maria do Rosário Mureb, a Zarinho Mureb, tia de Taz, ficou indignada com o episódio, informando ainda que o telefone da sobrinha teria ficado apreendido na delegacia.
– A Taz não é bandida e não estava armada. A gente lutou muito para acabar com a Ditadura para, hoje, policiais jogarem spray de pimenta na cara de uma moça. É um movimento legítimo. Uma manifestação cultural pacífica – reclamou.
O presidente da subseção de Cabo Frio da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Einsenhower Dias Mariano, ao ver o vídeo do momento da prisão de Taz Mureb, considerou a ação da polícia “um absurdo”: “Convocarei a comissão de direitos humanos para uma visita para a delegacia”, afirmou ele.
Diogo Rodrigues: “fui agredido por um policial dentro da delegacia”
Não bastasse a ação truculenta da PM no momento da prisão dos ativistas, ainda no centro da cidade, os seis artistas que foram parar na 126ª DP (Cabo Frio) reclamaram do tratamento recebido lá. O mais incisivo nas críticas foi Diogo Rodrigues, que vende poesia na rua. Ele afirma que foi espancado por um policial civil dentro da delegacia.
– Quando a gente foi detido eu estava nu, junto com os outros. Aí eu falei para o único menor que estava lá na delegacia: “sai daqui, você não precisa prestar depoimento”. Neste momento, um policial civil montou em cima de mim, irritado, e começou a chutar as minhas costas. Ele também deu socos. Aí ele perguntou o que eu estava fazendo ali e eu dei a resposta óbvia: “apanhando” – contou Diogo, na porta da delegacia, após ser liberado, enquanto exibia as marcas da agressão. Segundo ele, foram necessários cinco policiais militares para conter o agressor.
Taz Mureb e Diogo Rodrigues se abraçam na delegacia
A versão dele é confirmada pelo músico Otávio Augusto, o Feijão, que afirma ter presenciado a cena de violência. “O cara estava transtornado, bateu nele e tacou o revólver no chão de raiva. Ele ainda disse: “eu sou trabalhador, estou acordado há 48 horas e não vou tolerar desrespeito. Eu te bato porque não vai acontecer nada”, contou ele.
A rapper Taz Mureb, por sua vez, disse que houve negligência em relação ao seu estado de saúde, após ter recebido um jato de spray de pimenta no rosto.
– Tomei uma ducha na solitária junto com um preso homem, que estava de costas. Meu olho estava em carne viva. Eles falavam: “Ninguém nunca morreu com spray de pimenta” – relatou.
A Folha buscou explicações com o responsável por colher os depoimentos, mas este afirmou que só a delegada Flávia Monteiro poderia responder pelo caso. Ela, no entanto, estava em uma reunião e não pôde falar.