Manuella Peixoto foi para UFRJ: "Falta prioridade. A gente vê a Educação cada vez mais sucateada"
Entrar em uma universidade pública é o sonho de consumo de praticamente todos os estudantes que cursam o último ano do Ensino Médio. Passar no vestibular é considerada a coroação de muito esforço e de horas em sala de aula e com a cara nos livros. No entanto, para os alunos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), a maratona está com gosto amargo, por causa de uma crise sem precedentes na conceituada instituição de ensino e pesquisa.
As constantes greves por falta de pagamento nos salários dos professores e funcionários e a precariedade na estrutura decepcionam os jovens de Cabo Frio que tanto lutaram por uma vaga e agora estão com futuro incerto. Há alguns dias, a reitoria da instituição anunciou que as aulas estão suspensas até o fim do ano letivo de 2017.
– Insegurança, estresse, ansiedade. Sou apaixonada pela universidade, mas essa instabilidade acaba com meu psicológico. Eu me sinto atrasada, impossibilitada de trabalhar e sem ideia do dia que irei me formar. Eu estou perdida. Não sei se mudo de universidade ou se fico, pois eu me mudando parece que abandonei o barco, que fugi da luta – desabafa Juliana Bigonha, 23, cabofriense do Jardim Flamboyant, que está no terceiro período de Odontologia.
O lamento da jovem, ela garante, não se traduz em arrependimento por ter ingressado na universidade. Brenow Freitas, 22, também diz que não voltaria atrás na decisão de entrar para a instituição, mas não se mostra otimista por uma solução de curto prazo. O rapaz se preocupa com a situação dos bolsistas e de funcionários terceirizados.
– Eu tenho uma vida até tranquila, mas e quem depende das bolsas fornecidas pela faculdade? Ou simplesmente necessitam do bandejão para se alimentar? Fora os terceirizados, sem receber há meses, que já ouvi que passam fome. Acho que a instituição vai passar por isso, mas só no próximo governo, pois foi o atual que afundou o Rio na crise – diz Brenow, que é do Foguete e cursa Engenharia Cartográfica.
Já Manuella Peixoto, 19, pouco esperou para mudar de rumo. A estudante logo pediu transferência para o curso de Direito na UFRJ. Ela se disse desapontada depois de todo o esforço, incluindo as mais de dez horas diárias de estudo no ano passado. Consciente, a jovem culpa o Governo do Estado pela situação.
– Falta prioridade. A gente vê o governo dando isenções para empresas e a Educação cada vez mais sucateada. Muitas pesquisas estão sendo levadas para o exterior por falta de aparelhamento. Para mim, além de falta de prioridade, é uma falta de visão. De tudo o que se podia cortar, a Educação é o menos apropriado. Afundamos ainda mais na crise por não produzir conhecimento – raciocina.
Professor de História do Invest e do Instituto Santa Rosa, Melch Gomez prepara alunos para o vestibular e concorda com Manuella.
– O desmantelo é cristalino e eu acredito que já passou da hora da gente se levantar e cobrar do governo do estado uma posição quanto a esta agonia. A Uerj com suas portas fechadas, decididamente, compromete o desenvolvimento dentro do nosso estado – avalia.
Entretanto, apesar de todos os problemas, há quem não abra mão dos objetivos. No caso de Clara Branco, 18, cursar uma das melhores faculdades de Medicina do país. Após tirar conceito ‘A’ na primeira etapa, a moça prepara-se para a segunda fase, em dezembro. E para tudo o que mais vier.
– Eu me entristeço muito por ver colegas que passaram e ainda não tiveram aula. Mas tenho esperança num ensino público de qualidade. Quero entrar e lutar junto – planeja.
Em resposta à reportagem, a Secretaria Estadual de Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Social disse que “reconhece a importância da Uerj e tem concentrado esforços na busca de soluções para superar o atual quadro de dificuldades da instituição”. Segundo a pasta, o secretário Gustavo Tutuca irá se reunir em breve com a reitoria da Uerj para entender todos os passivos e custeios. Por fim, a secretaria disse que Governo do Estado aposta no acordo de recuperação fiscal com o Governo Federal para normalizar os serviços até outubro.
Juliana Bigonha se diz insegura e estressada