sexta, 29 de março de 2024
sexta, 29 de março de 2024
Cabo Frio
24°C
Alerj Superbanner
Park Lagos beer fest
Gramática

Quem nasce em Cabo Frio é cabo-friense, com hífen

Especialistas em linguística tiram dúvida e dizem que não há motivo para polêmica

01 setembro 2020 - 16h43Por Julian Viana e Tomás Baggio
Quem nasce em Cabo Frio é cabo-friense, com hífen

Cabofriense ou cabo-friense? Afinal, qual é a grafia correta da palavra que descreve quem nasce em Cabo Frio? Muita gente costuma escrever 'cabofriense', junto e sem hífen. Inclusive, assim é grafado o nome do clube de futebol: Associação Desportiva Cabofriense.

Nas redes sociais, é comum ver a volta do debate. Em publicação recente na página da Folha dos Lagos no Facebook, em que a palavra era grafada 'cabo-friense', um internauta reclamou.

"Cabofriense com hífen doeu a vista", disse.

Outro entrou na conversa e contestou.

"Quem nasce em Cabo Frio é cabo-friense".

O que escreveu a primeira mensagem voltou para reiterar.

"Já não é mais! Esse hífen caiu com a reforma ortográfica de 2008 (Decreto 6583/2008)", afirmou.

A incerteza também existe no meio literário. Segundo a presidente da Academia de Letras de Cabo Frio, Jaqueline Brum, muitos escritores ainda têm dúvidas sobre a maneira correta.

"Essa é uma dúvida muito recorrente também no meio literário. Já tivemos algumas discussões sobre o assunto. Alguns acreditam que as duas formas estariam corretas, no entanto, muitos escritores preferem com o hífen", afirma ela, que é bióloga e escritora. 

Apesar do grande debate, especialistas em Língua Portuguesa ouvidos pela Folha consideram que a polêmica não se justifica, e sentenciam: a palavra cabo-friense deve ser escrita com o hífen. 

Com poucas variações, as explicações se completam. Para a professora Mônica Cabral, mestre em Língua Portuguesa, a ausência do hífen em um nome próprio, como no caso do time Cabofriense, pode ser entendida como uma licença.

"O que acontece é o seguinte: os nomes próprios que são compostos, como Cabo Frio, têm os seus derivados, que a gente chama de adjetivos gentílicos ou pátrios. Se o nome original é composto, o adjetivo derivado desse nome também será uma palavra composta. Sendo assim, o uso do hífen é obrigatório. Por esse motivo a palavra cabo-friense precisa ter o hífen", explica, completando:

"De maneira geral, as pessoas esquecem o hífen. Na nossa cidade, por exemplo, o nome do time ‘Cabofriense’ não tem o hífen, mas isso pode explicado pela questão da licença por conta de ser um nome próprio, no caso o nome do time", considera.

O professor de Língua Portuguesa e Redação Bruno Ramos concorda.

"É a mesma regra que se usa para norte-americano, mato-grossense, belo-horizontino ou nova-iorquino, entre outros", exemplifica.

A professora de Língua Portuguesa e Redação Aline Machado dá outros argumentos para a mesma teoria. Segundo ela, "devemos usar o hífen nas palavras compostas derivadas de topônimos, que são os nomes próprios de lugares". Como 'Cabo Frio' é um nome composto e próprio de lugar, sua derivação 'cabo-friense' precisa ser escrita com hífen.

Sobre o decreto de implementação do novo acordo ortográfico da língua portuguesa, citado pelo internauta que escreveu na página da Folha, a professora considera que houve confusão.

"A reforma ortográfica foi assinada em 1990, para unificar a escrita nos nove países lusófonos, que falam e escrevem a língua portuguesa em todo o mundo. Foi mais uma questão política do que linguística, em virtude da necessidade de unificação das linguagens de documentos oficiais. Brasil e Portugal estiveram entre os últimos países a fazerem suas adequações. Após muitos prazos adiados, em 2008 começou um período de transição, e a partir de 2016 o novo acordo entrou definitivamente em vigor. O interessante é que, antes, o uso do hífen não seria obrigatório na palavra cabo-friense, mas justamente a partir deste documento, passou a ser", ensina Aline Machado.

Para encerrar qualquer discussão, a dica é conferir o Portal da Língua Portuguesa, uma página oficial ligada ao Ministério da Educação, que tem o objetivo de tirar dúvidas em relação ao acordo ortográfico. Entre as ferramentas disponíveis está o Dicionário de Gentílicos e Topônimos. Dentro dele, uma lista para consulta gentílicos já adaptados ao acordo ortográfico. 

Na letra C, o fim de qualquer dúvida. Cabo-friense, com hífen, aparece próximo a cabo-verdense (natural de Cabo Verde) e aos demais gentílicos ou substantivos compostos que são formados por duas palavras que fazem sentido sozinhas.

Por convenção, a Folha dos Lagos costumava usar 'cabofriense', sem hífen, em suas reportagens. A partir desta matéria, o jornal deixa de aceitar a forma antiga e passa a grafar a palavra de acordo com a norma gramatical.

O jornalista Thiago Freitas, escritor e colaborador da Sophia Editora, que publica autores da região, considera a decisão acertada.

"Sou defensor dos diferentes falares da língua de acordo com a região, mais não dos escritos... vale o que reza a gramática", afirma.