FERNANDA CARRIÇO
A viuvez dela já passava dos 26 anos. A separação dele durava uns cinco. E, quando não mais podiam crer que a vida se revelaria em cores que só o amor é capaz de conceder, um encontro de olhares fez com que os corações explodissem em esperança. Seria ela a primeira a levá-lo ao altar? Seria ele o amor que lhe devolveria o sorriso? O romance dos aposentados Evaldo Silva Rangel, 76, e Manuelina Ramalho Santos, 82, de fato parece vir de um conto de fadas. O casamento que acontece hoje, às 16h, na Secretaria Adjunta Municipal da Melhor Idade de Cabo Frio, é a coroação de um amor tardio, termo muito usado em tempos de exaltação da vida na melhor idade.
Há pouco mais de um ano eles se conheceram nos ensaios do Coral Intergeracional da Secretaria e não tinham ideia de que as conversas os aproximariam de tal modo que não conseguissem mais se separar. Evaldo reconhece que teve que recorrer ao famoso “joguinho de amor” para conquistá-la e confessa isso diante de uma mulher que reluz de alegria ao ouvir as declara- ções do noivo. Foram meses de tentativa, até o pedido oficial de namoro sair.
– Eu a chamei num canto e dei de presente uma caneca que tinha um cachorrinho com a língua para fora e uma gatinha. Depois do presente, perguntei se ela queria namorar comigo. Ela não respondeu, mas quem cala consente – diverte-se ele.
– Aí ele me deu um beijo no rosto e eu não gostei, achei que seria na boca. Ele era muito tímido, agora que está ficando sem vergonha – gargalha Ma- nuelina, sob o olhar orgulhoso de Evaldo.
Certos de que a história deles pode inspirar outros que já perderam a esperança de se livrar da solidão, o casal de pombinhos esbanja alegria ao contar em detalhes o desenrolar do romance. Um dos episódios mais exaltados por eles foi quando tomaram a decisão de morar juntos – o que já acontece há alguns meses. E para quebrar paradigmas, o convite surgiu da dama. Dessa vez foi ele quem não respondeu em palavras, mas prontamente assumiu um jogo de sedução.
– A jogada que eu fiz foi a melhor. Fui tomar café na casa dela à tarde e, quando terminou o café inventei que estava com medo de ir para casa. Isso era umas cinco da tarde, em pleno sol, e eu dizendo que estava com medo de ir do Caiçara para o Braga. Arrumei um pretexto e fiquei – relembra às gargalhadas.
E vai ter lua de mel?
Calma e paciência foram os ingredientes que Evaldo e Manuelina lançaram mão para a evolução do relacionamento. Apesar de esbanjarem saúde os dois são conscientes dos limites impostos pela idade, mas não se fazem de rogados quando o as- sunto é sexo – o que ainda é um tabu na terceira idade. Como fica a vida sexual de um casal a essa altura da vida? A pergunta inevitável sai timidamente. Mas a linda mulher, vaidosa, alegre e plena, coloca a timidez de lado e abre o verbo: tem sexo sim, tem desejo, tem tesão. Claro, à maneira deles – como ressalta seu Evaldo.
– O sexo nessa altura da vida é diferente, a pessoa tem que se entregar e se preparar. Tem que sentir que o outro está te completando. Nós fazemos sexo sim, do nosso jeito e com muito amor – suspira o noivo. Já Manuelina, no topo da experiência dos 82 anos vividos com muita alegria, como ela faz questão de ressaltar, não pensa duas vezes antes de declarar:
– Nessa vida adulta o amor é lindo, é um amor diferente, não é um amor possessivo. É um amor sincero, fiel, sem medo. É um amor com gosto de quero mais, um beijo gostoso. Nessa idade me sinto mulher, me sinto gostosa – declara a pulsante Manuelina, que confessa que está animada com os três dias de lua de mel que passarão em Raposo (MG).
Imediatamente, o noivo completa:
– Cheguei à conclusão de que a vida é boa para se viver, traz surpresas agradáveis como a minha deusa Manuelina – suspira o também poeta Evaldo, que em seguida faz uma longa pausa.
O rubor da face entrega a emoção que toma conta dele. Depois de uns segundos de silêncio, observados atentamente pela noiva, ele conclui:
– E eu ainda vou ter a oportunidade de casar com essa idade – se emociona.
– Estamos vivendo aquilo que nunca pudemos viver na nossa juventude. Ele é o amor da minha vida – interrompe Manuelina, que segura na mão do futuro marido.
– E ela é o meu.
E como dizem os versos da música “Amor Tardio”, de autoria do argentino Alberto Cortez, “Amor tardio, tocha reavivada com nova energia onde não havia nada...Amor tardio, que inunda de cores os mais obscuros espaços interiores....”.