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Folha diária

Na primeira edição diária, semelhanças com os dias atuais

Em 6 de julho de 1999, jornal circulava com 16 páginas e mudanças na capa

06 julho 2019 - 15h05Por Rodrigo Branco I Fotos: Reprodução

A história da Folha dos Lagos é marcada pela ousadia e, sobretudo, pelo destemor. Se a fundação do jornal, em abril de 1990, veio pouco depois do traumático confisco nas poupanças no governo Collor, a mudança de periodicidade para circulação diária veio num momento que, se não tão dramático da história econômica brasileira, estava longe de ser uma ‘marolinha’. Era numa terça-feira, 6 de julho de 1999, que a primeira edição diária da Folha tinha lugar de destaque nas bacas da região.

Em que pesem os descompassos na economia que ameaçaram a estabilidade do real no início do segundo mandato do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, a edição inicial da Folha diária surgia robusta, com 16 páginas, com uma discreta reforma gráfica na capa e cheia de conteúdo produzido por um timaço de jornalistas do primeiro escalão da cidade. 

Na primeira página, a manchete principal “Banho de sangue no Jardim” estampava uma realidade que já se anunciava na Cabo Frio de duas décadas atrás, tempos em que a violência ainda não era medida por indicadores oficiais, mas que começava a incomodar a outrora pacata região. 

Ao longo desses 20 anos, a Folha sempre teve a capacidade de captar as principais questões do seu tempo, algumas delas que parecem eternas, tal qual a necessidade do uso da palavra ‘crise’. Na página 3 daquela edição inaugural, a manchete “Demitidos pelo comércio é um novo recorde” faz com que as atuais matérias sobre perdas de vagas com carteira assinada ganhem ares de ‘museu de grandes novidades’, como apregoava Cazuza em uma das suas canções. Na ocasião, a Folha noticiava que entre março e junho daquele ano, o número de demissões do comércio foi 252% maior do que o mesmo período de 1998. Qualquer semelhança com matérias atuais sobre o assunto não é mera coincidência. 

Uma enquete feita com cabofrienses retratava o desgosto com os rumos da economia que passava por turbulência no limiar do ano 2000, na esteira da crise de janeiro, com a desvalorização do real frente ao dólar e a posterior queda na Bolsa de São Paulo. Reclamações de salários congelados, inflação e desemprego mostravam que a lua de mel com o Plano Real, cinco anos depois da sua implantação havia acabado. 

– O dólar subiu, tudo aumentou (...) Acho que este segundo mandato do Fernando Henrique está sendo um desastre, e até assinaria essa tal lista pela renúncia dele – disse, à época, o célebre escritor cabofriense Célio Mendes Guimarães fazendo coro ao movimento ‘Fora FHC’, que ecoava entre a oposição naqueles tempos.

Naquela época, como agora, o debate e os embates políticos eram destaque nas páginas da Folha. Naquela manhã de inverno de 1999, os cabofrienses e moradores de cidades vizinhas ficavam sabendo sobre os últimos preparativos para o início das obras dos então novos quiosques da Praia do Forte, feitos de fibra de vidro. No Informe, uma nota revela que a questão é pano de fundo de disputa política entre os partidários do então prefeito Alair Corrêa e do seu antecessor José Bonifácio. 

Sob comoção e com ajuda da PM, os quiosqueiros foram retirados e obras começaram. Em 2013, o Ministério Público Federal (MPF) e o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) determinaram a retirada dos quiosques que estão sobre a areia dentro de 30 dias. Um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) foi firmado entre o Ministério Público Federal (MPF) e a prefeitura para impedir que estabelecimentos sejam assentados sobre dunas da orla, que são áreas de preservação e pertencem à União. Naquele mesmo ano, os atuais quiosques e a nova orla foram inaugurados. 
Outro destaque daquela edição foi a notícia de que um movimento de empresários lançou a pré-candidatura do então governador Anthony Garotinho à presidência, durante a inauguração de uma fábrica de beneficiamento de resíduos de gado bovino, em Campos. 

De fato, Garotinho renunciou ao Governo do Estado em abril de 2002 para concorrer à Presidência. Ficou terceiro lugar na corrida presidencial, com 17,87% dos votos válidos, atrás de Lula (PT), com 46,44% e José Serra (PSDB), com 23,2%. No segundo turno, Lula elegeu-se com 61,27% dos votos. O polêmico político e radialista foi preso três vezes entre novembro de 2016 e novembro de 2017, acusado de envolvimento com fraudes em programas sociais em Campos e de crimes eleitorais. Ele aguarda em liberdade o desfecho dos processos.

Muito antes disso, 20 anos atrás, ele manifestava a preocupação quanto à legalização das vans, assunto que também foi tratado no Informe dos Lagos, desde sempre uma das seções mais lidas do jornal. 

Um ano depois da privatização das empresas públicas de telegonia, a adaptação às novas tecnologias também foi destacada na reportagem “Caos na telefonia também chega à Região dos Lagos”. No texto, foram mostradas as agruras dos usuários do sistema de telefonia, para fazer chamadas à distância (DDD). A partir daquela época, o usuário podia escolher a operadora para completar a ligação interurbana, mas as novas regras, a sobrecarga e a pane no sistema da Embratel irritaram os usuários. 

Mas primeira edição diária, a de número 546 da história do jornal, foi de festa e muitas congratulações de autoridades pelo feito da Folha, um marco na trajetória da imprensa regional. O veículo recebeu as felicitações dos prefeitos Alair (Cabo Frio); Carlindo Filho (São Pedro da Aldeia); Mirinho Braga (Búzios) e Renato Vianna (Arraial do Cabo), este pai do atual prefeito, Renatinho; entre outras personalidades e o público em geral.

Sempre forte no colunismo e na opinião, a Folha também apresentava uma delicada crônica sobre a história de Cabo Frio, na pena inspirada do saudoso jornalista Fausto Neto. 

As linhas de uma ideia arrojada, mas que se revelou bem sucedida foram lançadas, ou melhor redigidas, em uma manhã de inverno como o de agora. O jornalista e empresário Moacir Cabral já dizia, em tom profético, o que estaria por vir nas décadas seguintes. A declaração é da edição de 3 de julho de 1999, a última antes do veículo tornar-se diário. 

– O diário é um desafio que entendemos ser passível de interrupção, embora não acreditemos que isso vá acontecer. A humildade, em qualquer projeto, transforma-se na virtude-mãe. O projeto diário não é um desejo meramente pessoal e sim uma exigência do leitor, do anunciante, enfim, da sociedade – comentou.