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Especialistas condenam caso de linchamento em Araruama

Justiça com as próprias mãos e divulgação de informações falsas online são questionadas

07 abril 2017 - 00h57Por Gabriel Tinoco | Foto: Reprodução
Especialistas condenam caso de linchamento em Araruama

 “Atividade, atividade aí ago­ra, rapaziada. Tentaram roubar uma criança ainda agora, em um Escort branco, antigo. É um coroa já de idade e uma mulher mais nova. Tentaram roubar uma criança aqui (...)”.

Esse é o conteúdo do que a Polícia Civil acredita ser o áu­dio que deu origem ao boato que resultou na tentativa de lin­chamento de um casal em Ara­ruama, na tarde de quarta-feira. A polícia tenta agora identificar quem foi o homem que come­çou a espalhar o boato nas redes sociais. O delegado da 118ªDP (Araruama), Luiz Henrique Marques, informou que áudios, fotos e vídeos são usados para ajudar na investigação do caso.

Luiz Áureo de Paula e Pame­la Almeida Ramalho, colegas de trabalho, foram acusados de se­questro por moradores do bair­ro Mutirão e retirados à força de dentro do carro em que es­tavam. O boato se espalhou pe­las redes sociais e os dois foram agredidos pela multidão que os cercava. Tiveram o carro quei­mado e, por pouco, não foram linchados. Agora, Pamela não quer mais voltar para casa, com medo de sofrer violência. Trau­matizada, ela foi com o marido para um lugar isolado e busca abrigo em casa de parentes.

Especialistas pedem cautela com informações

Já foi comprovado que Luiz Aurélio e Pâmela Almeida não tinham a mínima relação com o crime. Os dois foram retirados do carro – posteriormente quei­mado – e agredidos por uma multidão furiosa, contida apenas pela ação policial. A mãe preci­sou aparecer e dizer que a mu­lher apenas elogiou a criança.

Para o cientista social Wan­derson Jardim, o Pequeno, as redes sociais são uma poderosa ferramenta de divulgação – in­clusive do ‘justiçamento’, que ele mesmo condena.

– As redes sociais amplificam as questões. Os factóides aca­bam tomando amplitude maior. A justiça com as próprias mãos é ruim. O braço armado do esta­do existe para resolução de con­flitos. Se cada um decidir fazer justiça, será um bangue-bangue. Embora o Estado não atue como deveria, ele é a instituição res­ponsável pela administração e resolução de conflitos – pondera o mestre em Antropologia.

De acordo com ele, a ascensão de deputados com o discurso de extrema-direita também incentiva a justiça com as próprias mãos.

– Há uma onda conservadora não só no Brasil, mas na própria Europa: na França, no Leste Eu­ropeu... E também nos Estados Unidos, com o Trump. No Bra­sil, esse expoente é o Bolsonaro. Essa perspectiva de justiçamen­to aumenta com representantes que defendam isso – explica.

Já o advogado Carlos Mag­no de Carvalho recorre à Idade Média para condenar os lincha­mentos e argumentar em favor ao direito de defesa.

– Voltamos à Idade Média onde era muito comum o julga­mento de pessoas, sem qualquer indício ou acusação formal, que invariavelmente terminava com a morte em praça pública. Muitos inocentes morreram assim.

O jornalista Ivan Lemos res­salta o dever da imprensa em desmentir inverdades.

– Essas atitudes irresponsá­veis têm feito a imprensa mudar pelo simples fato de que deve­mos prestar um serviço à po­pulação. Se nós, jornalistas, não agirmos em serviço da sociedade de forma rápida, essas falsas notícias se espa­lham e tomam uma proporção absurda, como aconteceu em Araruama e em vários outros lugares – afirma.