Deflagrada pela Polícia Federal em todo o Brasil na semana passada, a Operação Carne Fraca implodiu de vez a confiança do consumidor cabofriense na qualidade da carne disponível no mercado. Embora isso não signifique que boi, frango e porco desaparecerão da mesa, a tendência, segundo os próprios vendedores, é que haja queda.
Essa queda, como comprovou a reportagem da Folha na tarde de ontem, já está se alastrando por Cabo Frio. Esticando-se na ponta dos pés para conferir os cortes disponíveis no açougue de um supermercado no centro da cidade, a dona de casa Leila Silva está reticente. “Você veio me convencer a não comprar?”, ela pergunta, e, mesmo diante de uma negativa, argumenta:
– Porque eu te pergunto: você come em restaurante? Sim, né?! E você confia que o arroz é fresco? O feijão? Eu não como em restaurante há muito tempo, não tem como confiar. Quando você compra peito de frango embalado, você fica meia hora embaixo da pia lavando? Não, né?! A gente come muita sujeira... Eu tento evitar. Pizza, hambúrguer, tudo isso faço em casa. Mas tem coisa que realmente não dá – diz.
Ela afirma que vai continuar comprando carne porque “gosta muito”. Ainda assim, saca da bolsa o celular e mostra à reportagem um vídeo que circula pelo Whatsapp. Nas imagens, um homem desembala um tender e, ao cortá-lo, encontra jornal entremeado à carne. “Isso tem com salsicha também”, ela aponta; “Eu é que não como”, completa.
A Operação Carne Fraca denunciou que cerca de 40 frigoríficos no país, entre eles Sadia, Perdigão, Seara e Friboi, estariam usando conservantes acima do nível permitido – o que pode causar câncer – e misturando a carne com papelão e água (também acima do permitido).
O mecânico Walter da Conceição diz que já sabia das ‘falcatruas’ há muito tempo. Ainda assim, ele está num açougue do outro lado da cidade comprando um quilo e meio de alcatra. “É para um estrogonofe”, ele conta. Walter diz que espera convencer a família a reduzir o consumo.
– Rapaz, não é de hoje que eu desconfio. A carne não aguenta nesse calorão todo, indo para lá e para cá, eles botam veneno mesmo. Eu sempre soube. Mas agora está provado, né?! Eu não quero ter câncer, não. Já falei com a mulher e com a sogra para a gente comer menos carne vermelha, mas toda hora pedem para eu comprar carne para isso, carne para aquilo. Dá menos trabalho, fazer o quê?! – resigna-se.
Imediatamente atrás dele na fila está a aponsetada Sonia Simão, que segura nas mãos duas caixas de hambúrguer Seara – uma das marcas denunciadas.
– A gente pode até reduzir, mas substituir não dá. Só se virar vegetariano, mas aí não dá, né. O que a gente tem feito lá em casa é comer ovo mexido de vez em quando. Porque peixe não dá. É caro e dá trabalho de fazer. Tenho que mandar meu neto pra escola, aí faço isso ou vou limpar o peixe? – ela diz, apontando para as caixas de hambúrguer.
No Açougue do Marcelo, na Teixeira e Souza, o proprietário Marcelo Paiva está apreensivo.
– Isso vai prejudicar a gente, com certeza. Eu nunca confiei em carne embalada. Desde que montei o açougue compro direto do frigorífico. Gosto de trabalhar com carne no osso, aí eu mesmo desosso ali atrás e conservo – ele explica, apontando para as câmaras de armazenamento nos fundos do pequeno açougue.
– É por isso que estou aqui há vinte anos. Porque dá para confiar na carne que eu vendo. É direto do osso, a qualidade é outra, não é misturada com nada. É a carne que eu como em casa – diz.
Marcelo acha, no entanto, que todo esse reboliço possa beneficiar o pequeno açougueiro a médio prazo.
– As pessoas só estão falando disso, né?! Estão desconfiadas. A venda vai cair, isso é um fato. O que pode acontecer é, ali na frente, elas virem mais aos pequenos açougueiros que trabalham com uma carne que ela consegue ver, que não está embalada. Mas isso é mais pra frente. Agora a desconfiança ainda está grande.
E está mesmo. Ressabiada, Leila Silva, amante da carne, muda de ideia. Ela devolve a sacolinha de carne moída que tinha pedido, vira-se para reportagem e diz: “troquei, viu?! Vou comprar fruta que é melhor”.