segunda, 06 de maio de 2024
segunda, 06 de maio de 2024
Cabo Frio
24°C
Park Lagos Super banner
Park Lagos beer fest
'Era peixe que não acabava mais'

A lagoa vive: pescador captura perumbeba gigante em São Pedro da Aldeia

Seu Jarlei Rodrigues encontra peixe de 29 quilos; e não é história de pescador: fotos comprovam o feito

31 outubro 2022 - 20h08Por Fernanda Carriço

Tinha tudo para ser mais um dia de pesca de rotina, mas aquela manhã de julho foi diferente para Jarlei Rodrigues da Silva da Costa, 56 anos, acostumado a tirar das águas hipersalinas da Laguna de Araruama seu sustento desde a infância – começou na profissão com apenas oito anos. Eram cerca de 6h30 quando o morador de São Pedro da Aldeia avistou algo muito grande na rede. Assustou-se. Quando chegou mais perto, a surpresa foi maior ainda. Estava lá, diante dos seus olhos, em pleno ano de 2022, a maior perumbeba já pescada na Laguna de Araruama.

— Quando eu vi, eu nem quis saber de mais nada que poderia ter na rede. Eu precisei de ajuda pra tirar ele da rede e carregar. Só pra limpar o peixe eu demorei três horas. E só pensei em comer. Até apareceu gente pra comprar, mas eu quis comer com a minha família.

O peixe de 29 quilos entrou pra história local. Por onde quer que passe, seu Jarlei ouve algum comentário da perumbeba. E, claro, ele adora contar a história, mesmo porque a espécie andava sumida por essas águas. A melhoria da balneabilidade da laguna fez com que a perumbeba ressurgisse, assim como a carapeba.  Seu Jarlei dividiu com os quatro irmãos.

—  Era peixe que não acabava mais. Rendeu umas três refeições lá em casa. Fora o que dei para os meus irmãos. Minha esposa fez ensopado com pirão. É um peixe com sabor forte. Ela não gostou muito . Mas eu adorei e ri muito também. Comemos muito, e o peixe ainda continuava lá, não acabava. Perguntava ao meu filho se queria mais e ele dizia que não aguentava mais (risos) – conta.

O filho do seu Jarlei, Hyan Valadares, também faz coro ao pai.

— É um peixe muito bom, com pouca espinha. Me marcou que foi o maior peixe que já vi na lagoa. É uma lembrança boa que vou ter vai ser do meu pai pescando. E que nossa Lagoa está muito boa e limpa. E o sabor da comida: muito bom – diz Hyan.

É de frente para a lagoa de água cristalina, em um dia de sol forte de outubro no Boqueirão, que seu Jarlei encontrou a reportagem da Folha. De lá, fez questão de seguir até a Baleia para mostrar as belezas do lugar onde nasceu e cresceu. Na tradicional comunidade de pescadores, o assunto é um só: o tamanho da perumbeba que seu Jarlei pescou. Ele ouve o comentário dos amigos com sorriso no rosto e brilho nos olhos – não consegue disfarçar o orgulho. Na roda de conversa estava Paulo Cesar.  Mais conhecido como Azeredo, ele é apresentado com o pomposo título de “maior pescador da área”. Azeredo brinca com seu Jarlei:

— Foi sorte de pescador! Só vi a foto e a espinha! Não me convidou para comer – diverte-se Azeredo, rindo e brincando com o amigo Jarlei.

Brincadeiras à parte, Azeredo reconhece o feito do amigo e diz que é uma história que não pode se perder. Ele mesmo também revela suas próprias conquistas. Chegou a pescar uma carapeba de cerca de 25kg há uns anos e comandou uma pescaria recente que bateu recordes:

— Foram 2,3 toneladas de carapeba. Tínhamos quatro embarcações lotadas – relembra Azeredo, que é também um grande pescador da famosa tainha, peixe que está na memória dos moradores por ter o sabor de comida de infância que fica marcado para a vida toda.

— A tainha é a nossa comida. Não tem peixe igual — define Azeredo.

E a receita que ele mais gosta é a mais tradicional possível: tainha ensopada com pirão. Na ponta da língua, ele conta que ele mesmo prepara em casa, porque é uma das comidas que a filha ama.

— Refogo as rodelas de tomate e cebola no azeite. Quando está mole, coloco cheiro verde e coentro, dois dentes de alho e um pouco de água. Quando ferve, entra o peixe, que já coloquei sal uns 30 minutos antes. Ferve mais ou menos 20 minutos. Depois desfio um pedaço dele e faço o pirão.

Na beira da laguna, na Baleia, o papo corre solto e animado. A conversa é sobre a beleza que está a lagoa, o quanto lutam para preservá-la. Muito mais de ser fonte de sustento, a laguna confere, para estes pescadores, o próprio significado da vida. Por isso, a revitalização representa tanto para eles, que contam que até mesmo peixes de oceano têm aparecido, como xerelete, graçainha, moreia, monito e até lula, molusco tradicional nas águas de Arraial do Cabo. São informações que viraram estatística pesqueira através do projeto Imersão, parceria entre a Universidade Veiga de Almeida e a concessionária Prolagos. O projeto é coordenado pelo biólogo Eduardo Pimenta, também presidente do Comitê de Bacia Hidrográfica Lagos São João.

— Os dados que comprovam a melhoria da qualidade da Lagoa são dados técnicos e científicos, por monitoramento do corpo hídrico. Monitoramento feito pelo Inea, pelo Consórcio Intermunicipal Lagos São João e pela própria concessionária, que diz que entre 85% e 90% das praias lagunares estão em boas e ótimas condições de balneabilidade – sublinha o biólogo, ressaltando também a importância do período de defeso.

— Isso se converteu em melhorias também significativas para a produção pesqueira. Melhorou a qualidade da água e aumentou a quantidade de água que adentra na lagoa por conta da dragagem que está em curso. Outra coisa também que ajudou muito foi o período de defeso, de três meses. De uma maneira geral,o pescador cumpre isso.

As espécies mais pescadas na Laguna de Araruama

As espécies mais pescadas na Laguna de Araruama | Fonte: Projeto Imersão/Prolagos UVA

Para completar este círculo virtuoso, a Prolagos investiu mais de R$1,4 bilhão nos serviços de água e esgoto. Isso é mais do que o dobro de investimentos realizados por habitante do que a média nacional, de acordo com o Instituto Trata Brasil. “Com esta contribuição, o índice de coleta de esgoto passou de 0% para 80%, e 100% do que é coletado é tratado em uma das sete estações operadas pela companhia”, diz a concessionária, em nota. Além disso, em complemento ao atual modelo Coleta em Tempo Seco, nos próximos cinco anos a Prolagos irá investir aproximadamente R$ 1 bilhão em obras de saneamento em Armação dos Búzios, Arraial do Cabo, Cabo Frio, Iguaba Grande e São Pedro da Aldeia. E também informa que fará a implantação de rede separativa de esgoto, reivindicação antiga de moradores que será atendida. Afirma a concessionária: “A construção de rede coletora em cada município será por etapas, em áreas com maior concentração de habitantes para atender a 50% da população até 2026. Para otimizar os investimentos foram consideradas as áreas que tenham estações de tratamento e estações elevatórias (unidades de pressurização de esgoto) já instaladas”.

Outra medida que ajudou a melhora da balneabilidade foi a implantação de 38 quilômetros de cinturão coletor de esgoto, com recordes de pescado, desenvolvimento do turismo local e geração de renda para a população. Fato que é fiscalizado e testemunhado por pescadores como seu Jarlei e Azeredo, que observam o retorno de espécies como perumbeba ou carapeba.

— A perumbeba ficou um bocado de anos sem aparecer e reapareceu ano passado. Isso aqui é de uma riqueza tremenda. Quantos pescadores comem e bebem dessa lagoa? — exalta seu Jarlei, apontando para a imensidão de água, que contrasta com o azul do céu como se fosse um quadro pintado à mão. No barco que não tem nome, ele navega com simpatia e simplicidade que o acompanham como características de sua personalidade. É um entre tantos os pescadores da região. Mas um feito é só dele. Seu Jarlei pescou a maior perumbeba da Laguna de Araruama. É fato: registrado, fotografado e, agora, publicado. E não é história de pescador.