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Coluna

Feliz dia internacional da mulher pra quem?

12 março 2021 - 21h12

Chegamos na semana da mulher. Aquela semana em que nos desejam um dia incrível, aparecem com flores, chocolates ou jantares. As redes sociais pipocam fotos e palavras sobre como as mulheres são o doce da vida, a delicadeza e a beleza. Ou como somos guerreiras sempre dando conta de tudo e mais um pouco. Mas, feliz 8 de março pra quem, exatamente? Não quero estragar esse momento pra você, espero de verdade que você tenha tido uma segunda-feira cheia de amor e paz. Porém, e o resto do ano? Desculpa, mas eu preciso perguntar. Como vai o resto do ano pra você, mulher? Você já conseguiu ganhar o mesmo salário que um homem ganha na sua posição? 

Alias, você já conseguiu um emprego depois de dizer que tem filhos? Quantas vezes esse ano já duvidaram da sua capacidade ou do seu intelectual e te fizeram fazer parecer que você só está onde está por ter ‘agradado’ alguém importante, ou só por que é bonita? Você já olhou como andam os números de feminicídio no nosso país? Na última vez que chequei, a cada 8 minutos uma mulher é estuprada; a cada 2 minutos uma mulher sofre agressão física, dessas mulheres 90% são agredidas pelo próprio companheiro; mais de 600 mulheres assassinadas em menos de seis meses no ano de 2020. 

Me desculpem se ando meio amarga num dia que era para celebrar tudo o que conquistamos até aqui. Mas não consigo não pensar que tudo que a gente tem hoje foi conquistado justamente porque mulheres não podem respirar sem precisar batalhar pelo seu lugar. Não consigo deixar de pensar que ando nas ruas quase sempre em estado de alerta, e muito provavelmente em algum momento vou ouvir gracinhas de homens desconhecidos como se eu fosse apenas um pedaço de carne desfilando, e ainda vou precisar ouvir também que era só um elogio, nada demais, que eu deveria agradecer. Meu anjo, eu não pedi seu tesão e falta de noção disfarçados de candura e educação enquanto estou exercendo meu direito de ir e vir, me poupe. Me poupe também de toda vez que eu abrir a boca pra falar, seja num bar, seja no trabalho ou em casa, ter minha voz silenciada porque, apesar de quase homem nenhum admitir seu próprio machismo, não consegue nos achar suficientemente aptas a falar de tal ou tal coisa.

Então, sim, não consigo escrever sobre outra coisa que não seja esse descontentamento. E antes que você venha com seu papo furado de que isso é puro mimimi e vitimismo, eu aconselharia você a olhar melhor à sua volta, sua filha, sua irmã, sua mãe ou sua prima, que seja. Olhar melhor as notícias que nos recordam constantemente o quanto ainda há de ser feito pra que mulheres tenham igualdade. “Mas as mulheres já conquistaram isso, já somos iguais, o resto é tudo coisa de feminista mal comida cabeluda”. Se eu ganhasse um real toda vez que ouvisse isso daria pra pagar a creche do meu filho, comprar uma lâmina de barbear e ainda sobraria o troco de bala.

Mas desejo, sim, de todo meu coração a todas nós mulheres, menos peso pra carregar. Pais mais presentes e que não achem que duzentos reais de pensão dão e sobram pra ir à balada. Desejo que andar na rua seja apenas ir daqui ali, e não o perigo incessante de ter nossos corpos violados de maneira brutal. Que a gente consiga olhar nossas curvas acentuadas e cicatrizes com mais carinho e que o espelho não seja um dos nossos inimigos. Que nos amar não seja a tarefa mais difícil do universo, que se admirar não seja uma utopia. Que não precise se virar em quarenta e nove mulheres ao mesmo tempo pra fazer tudo, se sentir exausta, sugada, triturada e sozinha por isso e no final ouvir romanticamente que você é uma guerreira por dar conta, sendo que muito do que você da conta não deveria estar no seu caminho. Desejo mais leveza, mais amor, mais sorrisos e companheirismo. Poderia desejar força, paciência, determinação, otimismo... mas isso tudo é nosso sobrenome.