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Candidatura laranja gera cassação de mandato na região

Decisão para Rio das Ostras volta a gerar expectativa sobre a situação de alguns vereadores, em Cabo Frio

30 abril 2022 - 10h41Por Cristiane Zotich

O uso de falsas candidaturas de mulheres em eleições municipais acaba de gerar novas punições na região: por unanimidade, o colegiado do Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro (TRE-RJ) cassou os diplomas dos vereadores de Rio das Ostras, Rodrigo Jorge Barros e Tiago Crisostomo Barbosa, e ainda tornou inelegíveis, por oito anos, as duas candidatas "laranjas", Carmen Lucia Correia Spinelli e Rita de Cássia Sodré dos Santos. A decisão foi tomada nesta terça-feira (26), quando o TRE reconheceu que o diretório municipal do Cidadania, na cidade, cometeu fraude à cota de gênero na eleição de 2020.  

Além da cassação dos dois vereadores que teriam sido beneficiados pela fraude à cota de gênero, e da inelegibilidade das falsas candidatas, o colegiado do TRE-RJ também determinou a retotalização dos votos das eleições proporcionais de 2020 em Rio das Ostras, para o cálculo do novo quociente partidário. Ainda cabe recurso ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em Brasília.

Na decisão, a relatora do processo, desembargadora eleitoral Alessandra Bilac, disse haver provas de que as candidatas Carmen Lucia Spinelli e Rita de Cássia Sodré "não possuíam qualquer intenção de concorrer ao pleito", por não terem praticado atos de campanha nem realizado movimentação financeira. Além disso, as duas obtiveram votação inexpressiva e pediram, nas redes sociais, que os eleitores votassem em outros candidatos, demonstrando que elas "participaram e anuíram com a fraude à cota de gênero".

A decisão de Rio das Ostras volta a gerar expectativas sobre a situação de pelo menos sete vereadores de Cabo Frio, eleitos em 2020: Vinícius Corrêa, Vanderson Bento, Oséias de Tamoios, Davi Souza, Léo Mendes, Carol Midori e Rodolfo de Rui foram denunciados à Justiça Eleitoral por terem sido supostamente beneficiados pelo uso de candidaturas laranjas de mulheres nos partidos pelos quais concorreram na última eleição. Esse processo, no entanto, ainda segue no Ministério Público, e em segredo de Justiça.

Os casos de Rio das Ostras e Cabo Frio não são os únicos da região. Em fevereiro deste ano, a Folha divulgou a inelegibilidade de quatro pessoas envolvidas na fraude de cota de gênero em São Pedro da Aldeia. Neste caso, no entanto, o uso de falsas candidaturas de mulheres teria acontecido durante a eleição municipal de 2016, mas a decisão só saiu este ano. No caso aldeense, a ação investigou a apresentação de falsas candidaturas de mulheres pela coligação "O ser humano em primeiro lugar", formada pelas legendas PSD, Solidariedade, PRB e PSC. 

Segundo a relatora do processo, desembargadora eleitoral Kátia Junqueira, das seis candidatas apresentadas pela coligação, "duas demonstraram total desinteresse na disputa eleitoral, declarando que pediram votos para outros candidatos e não tendo prestado contas", o que demonstrou "atuação consciente das rés como laranja". Ela informou, ainda, que o esquema teria como objetivo "possibilitar o preenchimento da cota de gênero de forma superficial com intuito verdadeiro de alavancar a candidatura dos demais candidatos do sexo masculino". Com a decisão, as duas candidatas fictícias, além dos presidentes, à época, dos diretórios municipais do Solidariedade, José Antônio Martins Filho, e do PRB, Alcimar Nazaré Ramos de Souza, estão inelegíveis até 2024. Eles ainda podem recorrer ao Tribunal Superior Eleitoral.

Em recente conversa com a Folha, o advogado Davi Figueiredo lembrou que, em média, costuma levar de dois, a dois anos e meio, para esse tipo de processo transitar em julgado. Pós-graduado em Direito Público e em Direito Municipal, e ex-Procurador Geral nos municípios de Búzios, Arraial do Cabo, Iguaba Grande, Cabo Frio e São Pedro da Aldeia, entre outras experiências importantes no meio jurídico, Davi também frisou que “as candidaturas laranjas representam verdadeira fraude ao sistema proporcional de escolha dos candidatos uma vez que, além do atingimento de número mínimo de votos para a legenda, devem participar obrigatoriamente do pleito, segundo a regra estabelecida no parágrafo 3º, do artigo 10 da Lei 9.504/97 (Lei das Eleições), um percentual mínimo de 30% de mulheres em cada partido concorrente”.

- Alguns partidos políticos, diante da dificuldade de preenchimento de tal percentual obrigatório, utilizam-se do ardil de apenas inscrever o nome de mulheres de confiança que sequer chegam a realizar campanha, gastos eleitorais ou até mesmo confeccionar material gráfico, tendo suas votações por muita das vezes zeradas ou com um, dois e até três votos. Se houver desistência das mulheres no meio da corrida eleitoral, o partido tem por obrigação substituir a candidatura. 

Para exemplificar o que pode acontecer com os vereadores de Cabo Frio, que teriam se beneficiado com uma suposta fraude à cota de gêneros, Davi Figueiredo lembrou que em 17 de setembro de 2019, o Tribunal Superior Eleitoral, “reconhecendo o importante papel da participação da mulher na política”, decidiu manter a cassação de seis vereadores da cidade de Valença do Piauí (PI) que acabaram se beneficiando da candidatura “fantasma” ou “laranja” de mulheres que não chegaram a fazer campanha. 

- O TSE reconheceu que os eleitos se beneficiaram das candidaturas femininas fictícias para alcançar o quantitativo de votos totais, burlando o sistema eleitoral, indeferindo o registro de suas candidaturas e determinando a zeragem dos votos conferidos a todos os candidatos componentes da legenda e a sua retotalização. Em outro julgamento do TSE ocorrido em 20 de maio de 2021, nos autos do Respe 495-85, o Ministro Alexandre de Moraes salientou que “a votação zerada (de um candidato) é o absurdo, é o ápice da fraude. Nem a própria pessoa vota nela, ou seja, não se dá nem ao trabalho de esconder o quão ridícula é a fraude”.