Pouco mais de uma semana após o Ministério Público Federal (MPF) e o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ) instaurarem inquéritos para investigar a destruição da restinga na orla de Tamoios, um novo crime ambiental foi flagrado no segundo distrito de Cabo Frio. Desta vez, o alvo da degradação é a Fazenda Campos Novos, um local tombado como patrimônio histórico e cultural.
Caminhões que prestam serviço para a Companhia de Serviços Públicos de Cabo Frio (Comsercaf), autarquia municipal de limpeza urbana, foram flagrados despejando lixo e resíduos dentro da área da Fazenda Campos Novos. O material jogado na fazenda contém pneus, restos de móveis, sacos plásticos, papelão e outros dejetos.
O flagrante foi realizado nesta quinta-feira (6) pelo ex-vereador de Cabo Frio, Roberto de Jesus, que registrou toda a ação em vídeo e postou em suas redes sociais. A Folha entrou em contato com o governo municipal e questionou o motivo do lixo estar sendo despejado na fazenda, e não em um aterro sanitário, mas não houve resposta.
A Folha também questionou quais medidas seriam adotadas por parte da Secretaria Municipal de Meio Ambiente, já que o descarte de resíduos em local inadequado é considerado crime ambiental de acordo com a Lei Federal Nº 9.605/98. Foram feitos questionamentos, ainda, sobre a atuação da Secretaria Municipal de Cultura na proteção da Fazenda Campos Novos, para impedir esse tipo de ação, e também quais medidas o prefeito Serginho Azevedo iria tomar a respeito da situação, mas não houve resposta.
Após o flagrante, Roberto de Jesus registrou boletim de ocorrência da 126ª Delegacia de Polícia de Cabo Frio. A Folha teve acesso ao documento. Nele, o ex-vereador revela que a Licença de Operação INEA nº IN026572, utilizada como autorização para o descarte de lixo na fazenda, estaria suspensa, “o que acarreta no crime ambiental e de responsabilidade solidária”. Na ocorrência, Roberto de Jesus afirma que o lixo estava sendo despejado a cerca de 300 metros de distância da sede da Secretaria Municipal de Agricultura e Pesca.
Na delegacia, o ex-vereador cabo-friense também revelou que um fiscal do Instituto Estadual do Ambiente (Inea) chegou ao local e flagrou toda a ação, que se estendia por cerca de 1.000m². Em vídeo postado nas redes sociais nesta sexta-feira (7), Roberto mostrou o momento da chegada do fiscal. Nas imagens, é possível ouvir o funcionário do Inea abordando os prestadores de serviço da Comsercaf: “pra você poder fazer aqui tem que ter a origem, tem que ter nota fiscal, origem da onde ele veio”. Também é possível ouvir quando o fiscal afirma que “o que você está fazendo aqui hoje é um aterro sanitário”. E completa: “se isso aqui vai pra mídia, vocês não têm noção da dor de cabeça que vocês vão ter”. Apesar disso, segundo Roberto de Jesus, o fiscal do Inea não fez o registro oficial do fato, nem notificou o governo municipal, alegando que não houve flagrante. A Folha entrou em contato com o Inea questionando o comportamento do fiscal, e se houve alguma notificação oficial do órgão ao governo municipal, mas ainda não houve resposta.
Em conversa com a Folha, o ex-vereador cabo-friense afirmou que está reunindo todo o material, incluindo os flagrantes, para encaminhar ao MPE, ao MPF, e também ao Ministério da Cultura, já que a Fazenda Campos Novos é um patrimônio tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) desde 2011. Segundo informações disponíveis no site oficial da Prefeitura, o prédio foi fundado em 1690 pela Companhia de Jesus, e desempenhou papel fundamental no desenvolvimento econômico e cultural de Cabo Frio entre os séculos XVII e XVIII, sendo o principal núcleo agrícola da região neste período.
Construída sob um sambaqui, a Fazenda se estende por 184 hectares, em uma área de rara riqueza ambiental, pré-histórica e histórica. O prédio da fazenda é uma das poucas construções jesuíticas ainda de pé no território brasileiro. A restauração reitera o valor cultural do imóvel, que abriga uma casa-grande, a Igreja de Santo Inácio e um cemitério, configurando um dos conjuntos arquitetônicos jesuíticos mais relevantes do Brasil. Uma característica importante do projeto é a edificação da igreja, integrada com a casa-grande, o que permitia acesso exclusivo às missas
Também segundo informações disponíveis no site do governo municipal de Cabo Frio, personalidades importantes da história já se hospedaram na fazenda como D. Pedro II e Princesa Isabel, entre outros. Em 1832 ela recebeu a visita do maior naturalista de todos os tempos: Charles Darwin, durante sua viagem ao norte fluminense, de 08 a 24 de abril daquele ano.





