A constante situação negativa de balneabilidade das águas em pontos turísticos importantes em Cabo Frio acenderam um importante alerta: os investimentos feitos pela Prolagos para contenção do esgoto despejado há anos na Lagoa de Araruama estão mesmo funcionando? Segundo moradores e pescadores, a resposta é “não”. São constantes as denúncias de despejo de esgoto onde já existe cinturão coletor. A situação, inclusive, já foi confirmada pelo Inea, que através de levantamento de balneabilidade comprovou que pelo menos dois trechos da lagoa (Passagem e Palmeiras) estão impróprios para banho desde fevereiro deste ano, enquanto a Praia do Siqueira sofre com despejo de esgoto in natura há cerca de sete anos. Até mesmo o Canto do Forte já chegou a ter balneabilidade negativa, chamando a atenção inclusive do Ministério Público Federal, que acusou a Prolagos de estar cometendo crime ambiental.

Para buscar respostas, a Folha entrevistou o diretor-executivo da Prolagos, José Carlos Almeida, que garantiu a eficácia de todas as obras já executadas, e também das que estão em andamento. Ele explicou a situação do bairro da Passagem, lembrando que o local possui uma rede coletora às margens do Canal do Itajuru. Como o sistema utilizado desde os anos 2000 ainda é o de coleta em tempo seco (com o esgoto sendo captado pelas redes de drenagem que deveriam receber somente águas de chuva), em dias sem chuva os dejetos coletados são direcionado para a Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) da Praia do Siqueira. No entanto, em dias de chuva mais forte, as redes de drenagem extravasam, levando uma mistura de água de chuva e esgoto para a Lagoa de Araruama, que também acaba recebendo esgoto in natura através de ligações irregulares feitas fora da rede.

– Hoje, com foco em aumentar a cobertura e a proteção da Lagoa de Araruama, estamos ampliando o cinturão coletor, incluindo novos pontos em Cabo Frio, no Recanto das Dunas, Vila do Sol, Porto do Carro e Perynas. Além disso, estamos modernizando as duas estações de tratamento de esgoto da cidade, o que permitirá uma saída de efluente do processo de tratamento com uma maior qualidade, possibilitando até o uso dessa água para outros fins além do retorno ao corpo hídrico. Mas é fundamental que os moradores e comerciantes contribuam da forma adequada para o funcionamento do sistema como um todo. É importante saber como funciona o seu imóvel para adequá-lo, caso necessário - revelou José Carlos, lembrando que a situação é exatamente a mesma da orla da Praia das Palmeiras, que também tem estado imprópria para banho desde o começo deste ano. Em ambos os casos, segundo o diretor da Prolagos, “a população pode contribuir com denúncias de pontos de lançamento na lagoa”.

Quanto à situação da Praia do Siqueira, que segundo levantamento do Inea está com águas impróprias para banho há cerca de sete anos, José Carlos não soube dizer à Folha o motivo deste resultado negativo de forma constante e prolongada. Explicou apenas que em 2023 a Prolagos implantou cerca de 3 km de rede separativa de esgoto no bairro para atender os mais de 1.500 moradores, e que segue em contato permanente com as autoridades, lideranças comunitárias e associações de moradores para apoiar e buscar em conjunto melhorias para o local. Revelou, também, que em abril a concessionária deu início a uma obra “muito aguardada pelos moradores da região, a modernização da estação de tratamento que fica no local”. O investimento, segundo ele, é de cerca de R$ 100 milhões.

– Todos esses investimentos na lagoa podem apoiar na recuperação e preservação dela como um todo. Claro que além dessas novas obras, acompanhamos (com a população e com o poder concedente, ou seja, municípios e governo do estado) como podemos atender melhor a cidade e o meio ambiente, pensando em como os nossos sistemas de água e esgoto podem suprir as novas necessidades de uma região que está em constante desenvolvimento e crescimento. Com esta obra da estação de tratamento de esgoto da Praia do Siqueira, por exemplo, aumentaremos a capacidade média de tratamento em 50% e transformá-la ao nível terciário, um antigo pedido da população. Já tínhamos iniciado esta importante ação com a construção de uma nova etapa do tratamento preliminar, e, com a aprovação do nosso plano de investimento pela Agenersa, conseguiremos fazer em sequência a ampliação completa desta unidade. É um investimento de bastante complexidade que vai trazer melhorias não só para a cidade, mas para a região como um todo. Esta estação será uma das mais modernas do país e referência em saneamento. A previsão é que a obra seja concluída em dezembro do ano que vem - explicou.

Ainda segundo José Carlos, com o aumento da capacidade de tratamento das estações de São Pedro, as duas de Cabo Frio (Praia do Siqueira e Jardim Esperança), a construção de uma nova estação em Arraial, e todas essas novas obras de modernização “vamos poder falar com orgulho que todas as nossas estações atuam ao nível terciário”.

– O que vai fazer que retornemos para o meio ambiente não só um efluente com um tratamento mais eficiente, mas também que poderemos direcionar essa água para outras finalidades, como regar jardins. Com isso, atenderemos não só uma demanda atual e legítima da população, mas estaremos atentos às demandas futuras que poderão surgir.

Se Cabo Frio ainda tem alguns trechos urbanos de lagoa considerados impróprios para banho, cidades vizinhas como São Pedro da Aldeia e Iguaba Grande já resolveram esse problema: elas comemoram a certificação internacional da Bandeira Azul nas praias das Pedras de Sapiatiba e dos Ubás, respectivamente. Mas por que essas duas praias lagunares conseguiram ficar livres do despejo de esgoto, e esses trechos em Cabo Frio, ainda não? O diretor-executivo da Prolagos não soube responder. Lembrou apenas que “desde sua fundação, há quase 409 anos, até o início dos anos 2000, todo o esgoto de Cabo Frio ia direto para as praias lagunares e oceânicas”, e afirmou que em 26 anos de concessão a empresa já investiu mais de R$ 1,4 bilhão no saneamento de Cabo Frio e das outras cidades da área de concessão, “o que representa mais que o dobro de investimentos realizados por habitante, do que a média nacional dos últimos anos, de acordo com o Instituto Trata Brasil”.

– Esse investimento (feito após a concessão) proporcionou a implantação de um sistema que hoje conta com sete estações de tratamento, mais de 38 km de cinturão coletor de esgoto, diversas unidades operacionais de bombeamento, entre outros equipamentos, que contribuíram com o aumento da cobertura de coleta de esgoto de 0% para mais de 90%. Retomamos a obra iniciada em 2022 para a conclusão do trecho restante do cinturão coletor de esgoto no entorno da Lagoa de Araruama. É um trecho de 26 km de extensão, que vai se somar aos 38 km já existentes, totalizando 64 km de proteção à lagoa. Importante ressaltar que quando fizemos esses primeiros 38 km alguns anos atrás, foram priorizadas áreas com maior densidade populacional para conseguirmos captar maior quantidade de esgoto. Desde 2022 já implantamos o cinturão em locais importantes como Ubás, em Iguaba; na Vila Industrial, em Arraial do Cabo; perto do Mercado Municipal do Peixe, em Cabo Frio; e na altura do Condomínio Olga Zacarias, no Campo Redondo, em São Pedro. No momento, nossas equipes estão trabalhando no trecho próximo à UPA de São Pedro. No município aldeense, atuaremos também no Vinhateiro, Baixo Grande, Nova São Pedro, Mossoró e Recanto do Sol. Além das obras em Cabo Frio, no Recanto das Dunas, Vila do Sol, Porto do Carro e Perynas, vamos atuar também em Iguaba Grande, onde implantaremos rede de captação em tempo seco no Rio Salgado, que é a etapa mais complexa neste complemento da blindagem da laguna - revelou.

Após todos esses investimentos, será possível afirmar que todos os trechos de lagoa na área de concessão da Prolagos terão a mesma qualidade da água da Praia dos Ubás e das Pedras de Sapiatiba? José Carlos não deu certeza.

– Já obtivemos inúmeros avanços que não são apenas percebidos pela certificação internacional da Bandeira Azul, mas também pelo aumento da atividade pesqueira, evidenciado pelos dados do Projeto Imersão, que apontam crescimento de 26% na captura de pescado no ano passado em relação a 2022, entre outros indícios econômicos e turísticos. Mas não vamos parar. A Lagoa de Araruama é patrimônio natural que precisa do esforço de todos para ser completamente recuperada: concessionárias, governos estadual e municipal, agência reguladora e da população. Nós, como um dos agentes com atividades diretamente ligadas à preservação da laguna, seguimos com os nossos investimentos para melhorias do sistema e ouvindo constantemente pescadores e representantes do poder concedente para encontrar ações efetivas que levarão à recuperação plena. Entendemos que o saneamento básico é um importante propulsor da melhoria da laguna, bem como, dos indicadores de saúde alcançados na Região dos Lagos nos últimos anos, e do desenvolvimento econômico das cidades. Por isso, seguimos fazendo o nosso melhor e renovando a cada dia o compromisso de prestar um serviço de qualidade para a população e para o meio ambiente, olhando sempre para o agora, mas também para as gerações que ainda virão.