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Tchello Santa Rosa e as músicas que atravessam o Atlântico

Músico tem composições em trilha do filme ítalo-brasileiro Loucos Amores Líquidos

25 outubro 2025 - 12h17Por Redação
Tchello Santa Rosa e as músicas que atravessam o Atlântico

O violão vermelho da mãe foi um dos primeiros contatos do cabo-friense Marcelo Santa Rosa com a música. Ele segurava o instrumento no colo, porque era grande demais para os braços de uma criança de oito anos. 
 
— Minha mãe me botou num curso de violão, mas o professor pediu que eu não voltasse porque eu complicava a aula dos outros alunos — ele lembra, rindo, em conversa com a Folha por telefone. — Devo ter ido uns dois dias e já estava tirando a música de uma outra maneira, com muito mais acorde.
 
Décadas depois, o menino que desafiava o compasso das aulas se tornaria conhecido como Tchello, músico, produtor e dono do estúdio Capitania do Som, no bairro Portinho. 
 
No espaço, gravou as quatro músicas que atravessaram o Atlântico para integrar a trilha do filme ítalo-brasileiro Loucos Amores Líquidos, dirigido por Alexandre Avancini e produzido por Daíse Amaral, com Eriberto Leão, Ângela Vieira e Paloma Bernardi no elenco. A estreia internacional aconteceu em julho, durante o Festival de Cinema de Ischia, na Itália. O lançamento no Brasil ainda não foi confirmado.
 
Mas foi em 2022 que a parceria nasceu —o saxofonista Sandro Guimarães, também de Cabo Frio, apresentou Tchello ao produtor musical Daniel Figueiredo.
 
— O Sandro já tocou com o mundo inteiro e é amigo do Daniel, que tem um estúdio em Los Angeles. Ele me apresentou por videochamada e eu mandei um trabalho meu. O Daniel curtiu e logo a gente assinou contrato pra fazer um disco de dez músicas autorais cantadas — diz o músico de 61 anos.
 
Desse disco veio “Your Funny Soul”. Uma das escolhidas pela direção do filme, a canção foi produzida em parceria com a cantora argentina Camil, conhecida pela voz marcante e por se apresentar nas ruas de Arraial do Cabo. Ela cantou e também escreveu um poema em espanhol que faz parte da letra.
 
— Quando o Daniel me disse que a música tinha sido aprovada, fiquei muito lisonjeado. É diferente de compor trilha instrumental. É uma canção cantada que a direção achou que combinava com o filme.
 
Já as outras três faixas foram criadas especialmente para o longa, que acompanha três mulheres de diferentes gerações em busca do amor e de suas raízes, filmado entre Poços de Caldas, Diamantina e a região da Basilicata, no sul do país de Dante.
 
— O Daniel me mandou as cenas e pediu três músicas instrumentais. Eu via as imagens e sentia qual era a vibração da cena. Cada trilha tem um minuto, um minuto e meio.
 
Tchello encara o feito com uma serenidade que vem da estrada. Para ele, estar na trilha de um filme internacional é motivo de orgulho, mas não redefine o conceito de sucesso:
 
— As pessoas às vezes acham que o sucesso é apenas aquele de que as pessoas todas te reconhecem e tal, mas às vezes não. Às vezes, pra mim, por exemplo, eu me sinto um artista de sucesso por ter três músicas instrumentais e essa canção minha em um filme tão bacana, com uma produção tão legal, atores reconhecidos nacionalmente, atores globais.
 
Ele explica que o processo criativo vem de forma quase espontânea:
 
— Eu, 99% das vezes, componho do nada. Vem a melodia com a letra já, às vezes vem inteira. Eu não faço nenhum garrancho, não faço uma correção. Eu escrevo, pego o violão e a música sai todinha, letra e música. Mas, se tiver que compor também contratado (“faz uma música pra mim falando sobre o sol, a lua e o arco-íris") eu também pego e faço. Não tem essa, não.
 
A relação com a música e a trajetória é longa e marcada pela diversidade de experiências:
 
— Eu comecei em 1980 a tocar profissionalmente em Búzios. Cabo Frio e Búzios foram os primeiros lugares onde toquei ganhando um cachê. De 1980 pra cá já fiz uma porção de coisas em Cabo Frio, inclusive como produtor de eventos. Já fiz vários eventos na década de 80 e a gente tinha uma banda que já fazia música autoral, que sempre foi de vanguarda aqui na cidade.
 
Sobre a influência da cidade em sua música, pondera:
 
— Agora, dizer que Cabo Frio, a natureza, tem influência, eu estaria mentindo, porque, na verdade, tá tudo dentro da minha cabeça. Não interessa se eu tô em frente à praia ou se eu tô dentro de um quarto sem janela.

Tchello passou uma década trabalhando com jingles e publicidade em São Paulo. Voltou a Cabo Frio em 2001 —ano em que fundou a Capitania do Som, estúdio de música que virou ponto de encontro de músicos locais e onde produziu as músicas do filme.  
 
Gosta de lembrar que também faz outras coisas além de trabalhar apenas com a música: 

— Amo fazer clipes, filmar, editar. Tenho mais de cinquenta vídeos no YouTube com minha assinatura. Gosto tanto quanto tocar — diz ele, que atua ainda na Superintendência de Eventos da Secretaria de Cultura de Cabo Frio, sempre equilibrando funções.
 
Quando o assunto é o ponto mais marcante da carreira, cita tanto conquistas passadas quanto a experiência atual:
 
— Eu já fiz muitas coisas. Fiz uma turnê na França que me marcou demais, por uma série de motivos. Essa agora do cinema, eu espero que seja mais marcante também a partir do momento que eu for ao cinema e assistir ao filme e a música estiver lá. Eu nem sei se eles vão colocar, dessa música cantada, só o refrão ou só a introdução ou só o solo do sax do Sandro Guimarães, que é, pô, excepcional!
 
Ele também deixa um recado aos músicos e produtores da Região dos Lagos:
 
— Tem que ser perseverante, tem que ser profissional, tem que chegar no horário sempre, tem que sempre entregar o produto que você combinou na hora certa que você combinou. Eu costumo dizer: não é que eu sou bom nisso, não, é que eu faço demais. Faço todos os dias, o tempo inteiro. Então sou um cara treinado como um maratonista.
 
Sobre o futuro, conta que está produzindo mais um CD autoral para a gravadora de Los Angeles e fala, sem ansiedade, sobre a possibilidade de criar outra vez para o cinema:
 
— Se o Daniel Figueiredo gostar do resultado, quem sabe a gente faz outros trabalhos. Tô totalmente aberto.