Em seu terceiro livro, "Maresia corrói os dentes" (Sophia Editora, 2025), a poeta e jornalista Érica Magni mergulha nas memórias de Monte Alto, distrito de Arraial do Cabo (RJ), para tecer uma narrativa híbrida entre poesia e prosa. A obra, que nasce marcada pela urgência política e ambiental, retrata a vida em um território corroído não apenas pelo sal do mar, mas pela negligência do Estado e pela especulação imobiliária.
Depois de realizar sessões de autógrafos na Flip (Paraty), no Partisan da Lapa (Rio de Janeiro) e na Bienal da Pernambuco, a autora agora lança a obra na Região dos Lagos. Em Monte Alto, o encontro acontece no dia 5 de dezembro, na Banca do Natan, a partir das 16h, Em Cabo Frio, o lançamento será no dia seguinte, 6 de dezembro, na Usin4 Casa das Artes (Rua Geraldo de Abreu, 4 Jardim Excelsior - Cabo Frio), das 14h às 19h. Os dois dias contarão com poemas musicados com Luiza Souto.
Érica Mgni captura vozes muitas vezes silenciadas — pescadores, vendedores ambulantes, moradores de casas devoradas pelo tempo — e as transforma em literatura. “O livro fala sobre corrosão e permanência. Sobre o que resiste mesmo quando tudo tenta apagar”, diz.
A maresia, aqui, é mais que um fenômeno natural: é metáfora para o desgaste social, ambiental e afetivo de uma comunidade que insiste em existir. A obra surgiu de três anos de convivência com a região, onde a autora se tornou parte da paisagem. “As pessoas me viam e gritavam: ‘E o livro? Já escreveu?’”, relembra.
A maresia como metáfora existencial
O sal que corrói as estruturas de ferro nas praias de Monte Alto serve de metáfora central para a obra. "A maresia aparece como aquilo que destrói lentamente, mas também como o que deixa marcas, do que insiste", explica a autora. Essa dupla natureza, corrosão e permanência, estrutura todo o livro, que aborda desde a degradação ambiental até a resiliência dos afetos em meio à adversidade.
Os versos e fragmentos de Érica capturam com precisão o ritmo da vida à beira-mar: o vai-e-vem das marés que espelha a chegada e partida dos turistas; o silêncio ensurdecedor do inverno que contrasta com o burburinho efêmero do verão; o lento definhar das construções frente ao avanço do mar e do descaso. "Escolhi esses temas porque refletem não apenas minha experiência pessoal, mas uma urgência coletiva", afirma a escritora, destacando como a obra dialoga com questões ambientais e sociais prementes.
Influenciada por vozes como Conceição Evaristo, Hilda Hilst e João Cabral de Melo Neto, a autora desenvolve uma linguagem que é ao mesmo tempo lírica e concreta, capaz de traduzir em palavras a textura áspera da vida nas bordas. "Minha escrita é fragmentada, sensorial e afetiva", define a poeta, que optou por uma estrutura não linear para o livro. Os capítulos se organizam como ondas, às vezes suaves, às vezes violentas, criando um efeito de maré que envolve o leitor.
Um dos momentos mais marcantes da obra é o relato do incêndio que destruiu a casa da autora em Arraial do Cabo. Esse episódio, tratado com uma crueza que não exclui a beleza, serve como metáfora para todo o livro: da destruição pode nascer uma nova forma de ver o mundo. "O livro começa com o fogo, mas termina com o sal - ambos corrosivos, ambos transformadores", analisa Bruna Mitrano no posfácio da obra.
Sobre a autora
Érica Magni (Rio de Janeiro, 1986) é poeta, jornalista e criadora do podcast Rádio-Carta Mulher. Autora de "Poérica" (Editora Cousa, 2019) e "Areia na Olhota" (Editora Pedregulho, 2023), já colaborou com projetos ligados a comunidades indígenas e periféricas, como o livro "Diário de Área" (2021), sobre a etnia Yanomami. Vive entre a Região dos Lagos e Teresópolis, onde continua a escrever “tudo que a atravessa”.

12 Érica Magni Crédito foto_ Elissa Olveira.jpg (2)


