— Leitura é banho. Não é quando tem vontade, é diário. ‘Ah, mas eu não gosto!’ Vai feder.
A frase de Leandro Karnal foi uma das muitas que marcaram o terceiro dia da Feira Literária de Araruama, neste domingo (25). Diante de uma plateia numerosa e atenta na Praça Menino João Hélio, o historiador abordou o tema “Literatura e humanismo: a formação do cidadão pela palavra”, encerrando a sequência de palestras com nomes de projeção nacional.
A organização foi pontual e o público, diverso e atento, acompanhou a palestra com silêncio e participação. A tenda ficou lotada, o que fez com que muitos assistissem à apresentação do lado de fora, num telão instalado pela prefeitura.
Ao longo da fala, Karnal combinou conteúdo informativo e humor, provocando risos e reflexões.
— Estou aqui neste palco cheio de honra para mim, neste evento magnífico, porque um dia meu pai leu livros para mim. E ali eu desenvolvi um gosto que nunca parou.
Segundo ele, o hábito da leitura desde cedo forma vínculos afetivos e amplia a compreensão do outro:
— Um filho nunca esquecerá o que o pai disser de cor a ele de uma poesia.
— Quem lê e se condói da sorte de uma personagem tem empatia. Se torna um cidadão melhor, mais apto a uma relação com outras pessoas.
Para Karnal, o livro também deve desconcertar:
— O livro tem que também me surpreender, tem que me horrorizar, às vezes tem que ser de fato chocante. Eu só cresço diante da dificuldade.
A palestra também incluiu referências a autores brasileiros, experiências pessoais e grandes frases, como a que ele atribuiu a um professor angolano: “Que a morte lhe encontre vivo.”
Em entrevista à Folha antes da apresentação, Karnal comentou sobre desigualdades sociais em cidades como Araruama:
— Onde há contradições você precisa pensar mais. A desigualdade social, por exemplo, é uma construção histórica. Quanto mais difícil o lugar, mais a população tem que ler, pensar, escrever e se tornar crítica.
Também defendeu a presença de bibliotecas públicas ativas:
— Uma boa biblioteca pública tem que ser viva. Não é um depósito, mas é uma memória. E essa memória tem que interagir com as pessoas.
Ao ser perguntado sobre um livro essencial, respondeu:
— Algum grande livro de Machado de Assis. Dom Casmurro, Memórias Póstumas de Brás Cubas, O Alienista. Também Triste Fim de Policarpo Quaresma, de Lima Barreto, e algo de Clarice Lispector, Carolina Maria de Jesus.
Mais tarde, às 18h, a feira recebeu o poeta e jornalista Ramon Nunes Mello, que falou sobre Cazuza e o livro Cazuza, Meu Lance é Poesia, encerrando a programação de palestras.
A feira segue e encerra nesta segunda (26), com programação inédita voltada ao público infantil.