Segundo manuscritos antigos e outras formas de informações chegadas aos tempos atuais, entre as quais, e principalmente, a Bíblia, o mundo foi feito por Deus em seis dias, sendo que no sétimo Ele descansou. Claro que a contagem de tempo é apenas referencial, pois seis e sete são alegorias, representando diversos contextos. Mas o fato é que na descrição dos atos da criação não há qualquer referência à criação do dinheiro. “A terra, que era sem forma e vazia, recebeu os luminares, houve separações entre terras e águas, criadas as árvores, plantas e frutos, os animais e, por fim, o homem e a mulher”. Não é mencionada a criação da moeda, logo, somos levados a concluir que o dinheiro foi criado pelo homem como forma de facilitar a circulação de mercadorias, remunerar o trabalho humano e capitalizar os proprietários dos meios de produção. E aí, ele foi contaminado pelo vírus da ganância. Sua pureza foi maculada!
Anteriormente utilizava-se o “escambo” como meio de troca, sucedido pela utilização de moedas-mercadorias (sal, fios de sede, chocolate, especiarias, etc.). Somente no século VII a.C., Creso, rei da Lídia, atual Turquia, cunhou (imprimiu) as primeiras moedas entre os anos 640 a.C. e 630 a.C., com o objetivo de encontrar elemento de mediação entre as trocas, e como forma de criar retribuições e compensações entre consumidores e produtores. O que surgiu para facilitar e tornar práticas as transações, acabou por se avolumar de tal forma que ficou sem controle, o que levou Leon Tolstói (1828 – 1910), escritor russo, a proferir a seguinte frase: “O dinheiro representa uma nova forma de escravidão impessoal, em lugar da antiga escravidão pessoal”. A consequência é que em lugar de “senhor” do dinheiro, os homens passaram a ser “servos”. Surge um novo rei! Como em todo reino, as castas se estratificaram com um grupo de privilegiados, a nobreza, e uma massa de súditos subservientes, servos. Nesse imbróglio nem mesmo a religião ficou de fora. O que levou Voltaire (1694 – 1778), escritor iluminista francês, a dizer: “Em questões de dinheiro temos todos a mesma religião”.
Em todos os setores de interesse humano há necessidade de dinheiro. Na verdade, utilizando uma analogia, o dinheiro está para o mundo como o sangue para o corpo humano. A parte do corpo, que não for irrigada com sangue, morre. O setor de interesse humano que não utilizar dinheiro está fadado a desaparecer. Oscar Wilde (1854 – 1900), escritor, poeta e dramaturgo irlandês, disse certa vez: “Quando eu era jovem, pensava que o dinheiro era a coisa mais importante do mundo. Hoje, tenho certeza”.
Uma parábola moderna conta uma história interessante: “Certa vez um caixeiro viajante chegou a uma cidade do interior. Procurou o único hotel, fez uma reserva e deixou como garantia o valor de R$ 100,00, dizendo que iria percorrer sua clientela e depois voltaria para se hospedar. O dono do hotel, de posse da quantia, foi até ao açougue e pagou uma dívida de R$ 100,00 que tinha com o estabelecimento; o açougueiro, com o dinheiro recebido procurou o dono do armazém local e saldou uma dívida de R$ 100,00; o dono do armazém foi então até o hotel e pagou ao hoteleiro R$ 100,00 que estava lhe devendo. Algumas horas depois, o caixeiro viajante retornou e disse que tinha terminado mais cedo suas vendas e que não mais se hospedaria, uma vez que iria seguir viagem. O hoteleiro, então, devolveu seus R$ 100,00, e ele partiu. No final, todos os envolvidos foram saciados em suas necessidades, e o dinheiro cumpriu um de seus papéis, circular e fazer pessoas felizes.
Seria o caso de perguntar: O dinheiro é uma bênção ou uma maldição? A resposta é simples: Depende da forma como é utilizado. No caso relatado acima foi uma bênção, no caso bíblico de Judas Iscariotes, que vendeu Jesus por 30 moedas de prata, uma maldição.
O dinheiro como “senhor”, corrompe as pessoas, pulveriza o caráter. Millôr Fernandes (1923 – 2012), escritor e humorista brasileiro, é autor de uma frase que descortina esse lado sombrio do dinheiro: “O dinheiro não só fala, como faz muita gente calar a boca”. Entretanto, o dinheiro é também uma instituição social que toma diferentes formas, em diferentes momentos da história humana. Como “rei”, nas mãos do Estado, o dinheiro impinge sacrifícios ao povo quando incorpora o papel de tributo; nas mãos dos banqueiros surge como um déspota insensível que só quer mais dinheiro; nas mãos dos filantropos faz o bem, ameniza aflições.
Fato é que, segundo diz Millôr Fernandes, “o dinheiro pode não dar felicidade, mas paga tudo que ela gasta”.