Uma das páginas mais vergonhosas da história universal é aquela que registra a atuação de um movimento político-religioso que ocorreu entre os séculos XII e XIX na Europa e nas Américas e que ficou conhecido como Inquisição. Inicialmente, o objetivo era buscar o arrependimento daqueles considerados hereges pela Igreja dominante e condenar as teorias contrárias aos dogmas do cristianismo. No entanto, como a Igreja buscava impor ordem e unificar a fé, em uma época em que aconteciam conflitos religiosos entre Estado e Igreja, onde pecados eram vistos como crime, a Inquisição também investigava e punia condutas inadequadas de clérigos e práticas como bigamia, judaizar, entre outras. Também serviu para consolidar poder, controlar a sociedade e enriquecer lideranças, deixando um legado controverso na história. O braço de execução da Inquisição era o temido “Tribunal do Santo Ofício”, que se identificava como instituição burocrática e de julgamento, semelhante a uma mistura de polícia e tribunal, criado para investigar e reprimir a heresia, apostasia, bruxaria e outros desvios da doutrina. Para isso, usava investigações sigilosas, tortura para confissões e penas severas como prisão, confisco de bens e pena capital pelo poder civil, frequentemente na fogueira, que simbolizava a purificação, denominada “auto de fé”.
Este sistema de purificação e doutrinação persistiu por séculos, sendo abolido gradualmente em diferentes momentos: em Portugal, em 1821; na Espanha, em 1834. Nos outros países onde foi instalada, a extinção foi acontecendo à medida que ia perdendo força.
A Inquisição no Brasil Colônia vigorou por quase três séculos (XVI a XVIII), através do Tribunal do Santo Ofício, utilizando agentes que investigavam, prendiam e julgavam os “hereges”, como judeus, praticantes de religiões de matriz africana, bígamos e aqueles com crenças sincréticas, utilizando métodos como tortura e exílio, deixando um legado de perseguição e repressão.
Mas a pergunta que não quer calar: será que a Inquisição acabou mesmo? A resposta é não! Com nova roupagem, desvinculada do nome original e da cobertura da Igreja, continuam as ações praticadas por autoridades de diversos níveis, que remetem aos tempos originais. Só que agora os perseguidos são negros sem recursos, adversários políticos de quem exerce o poder, pobres em geral, entre outras situações de exceção, o que nos leva a uma frase do escritor italiano Luciano Bianciardi (1922–1971), que disse: “A política… há muito tempo deixou de ser ciência do bom governo e, em vez disso, tornou-se arte da conquista e da conservação de poder”.
Percebemos que nos dias atuais, na maioria dos países, incluindo o Brasil, vige a máxima de que tudo nos é permitido manifestar, conquanto seja da vontade dos que detêm o poder. Dom Helder Câmara (1909–1999), arcebispo católico, disse certa vez: “Quando dou comida aos pobres, me chamam de santo. Quando pergunto por que eles são pobres, chamam-me de comunista”.
A Inquisição moderna é silenciosa, sem regras, e muitas vezes exercida por quem deveria combatê-la. Os que se colocam contra são imediatamente punidos com sanções que funcionam como mordaça, isso quando não sofrem retaliações.
No Sermão da Montanha, registrado na Bíblia, Jesus declarou: “Bem-aventurados os perseguidos por causa da justiça, porque deles é o Reino dos Céus”. Referia-se Ele a todos que sofriam, e sofrem, perseguição, zombaria e calúnias por serem justos.

