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Coluna

Do sal ao estreito: a semiótica de uma terra salgada atravessada pela capital

16 maio 2025 - 16h00

O Centro Cultural dos Correios, no Rio de Janeiro, abriu as portas para uma importante exposição na última quarta-feira (14 de maio). A mostra Do Sal ao Estreito segue até o dia 28 de junho. O projeto expográfico do artista plástico Ian Salamente e sua curadora Rayssa Veríssimo, ambos cabo-frienses, resgata pontos-chave dos símbolos regionalistas das indústrias locais e sua relação com os corpos impactados pelo momento contemporâneo e o esgarçamento das relações entre sociedade e economia. A matéria-prima simbólica da mostra é o sal, um recurso que foi abundante na região e que agora é indício de decadência e resistência na semiótica local.

Nascido em Cabo Frio e morador do bairro Jardim Caiçara, Ian foi aluno do artista plástico Reinaldo Caó. Desenvolveu murais que podem ser encontrados no seu bairro de origem e em muitos pontos por toda a cidade. Pela grandiosidade do seu impacto artístico, teve de migrar para a capital para que assim tivesse o devido reconhecimento na produção de diálogos modernos sobre o regionalismo e suas facetas provincianas. A mostra também revela um artista atravessado pela capital e por suas influências no cotidiano. Ao misturar a história local e a do grande centro urbano que é o Rio de Janeiro, Ian nos conduz com suas antenas parabólicas a uma percepção que o movimento do manguebeat também propôs nos anos noventa: a ideia de sermos receptores de diferentes informações culturais e pensá-las a partir das nossas origens e territórios como tentativa de propor o novo, sem perder nossas raízes. 

Ian, como artista, faz isso com uma sutileza lírica e surrealista que nos conduz através das salinas, dos galpões de sal, das camisas de futebol e seus espaços de coletividade, dos quintais, marquises e rostos estafados de trabalhadores desiludidos com o porvir. Suas obras também incluem elementos que fazem referência à mobilidade urbana, à medida da distância subjetiva e objetiva; ironicamente se utilizando da identidade visual de uma empresa monopolista que é a Salineira na cidade de Cabo Frio.

Do Sal ao Estreito desvela as dificuldades de se habitar tanto em paisagens de horizontes longínquos e espelhados quanto em ambientes urbanos claustrofóbicos. Os sujeitos retratados nas obras que compõem a exposição demonstram que, mesmo atravessados pelas dificuldades inerentes ao capitalismo, surgem como pontos convergentes, a serem referências para fora dos limites do território.

Com essa exposição o artista pôs sobre seus ombros — ou sua caçamba de ideias — todo um discurso linguístico que é parte do que constitui o indivíduo cidadão de Cabo Frio. Com seu talento e perseverança, grita nos palcos das artes da capital as idiossincrasias de ser parte de um povo marcado pelo sal e pela terra que habita. Aos que estão na cidade do Rio de Janeiro e tiverem interesse de ver essa exposição, o Centro Cultural dos Correios do Rio de Janeiro fica na rua Visconde do Itaboraí, 20, Centro, e funciona de terça a sábado de 12h às 19h. A entrada é gratuita.

Vencer, enquanto cabo-friense e artista, é ver os da sua terra ganharem asas que se projetam para além dos limites do sol e do sal.