conservadorismo

Onda conservadora avança de olho nas eleições de 2018

Discurso considerado menos progressista ganha força e ecoa na política

29 OUT 2017 • POR Rodrigo Branco | Agência Brasil • 15h31

Bem colocado nas pesquisas para presidente, Bolsonaro foi um dos mais votados na região em 2014

“Desarmamento só para cidadão de bem”, queixou-se de forma irônica no Facebook da Folha, um internauta, em uma corriqueira matéria sobre troca de tiros entre policiais e traficantes. “Parabéns, quem educa minhas filhas sou eu, escola é para estudar matérias como Português e Matemática”, comentou outra, em apoio à vereadora de Búzios, Joice Costa (PP), que, segundo relatado em outra reportagem, tinha se posicionado fortemente contra a ‘ideologia de gênero’ em recente discurso na Câmara.

Não se tratam de fatos isolados. Desde 2014, a simpatia por ideias e pautas identificadas à direita vem ganhando mais espaço nas urnas. O fenômeno ganha for- ça em todo o país – e na Região dos Lagos não é diferente. Considerado por muitos o expoente máximo do pensamento radical, o deputado federal Jair Bolsonaro (PSC) pavimenta a pré-candidatura à Presidência da República por meio de um eleitorado ‘desiludido com a política’.

Há três anos, ele obteve 4.078 dos seus mais de 464 mil votos em Cabo Frio, sendo o terceiro mais votado, atrás apenas do atual prefeito Marquinho Mendes e de Paulo César, figuras carimbadas da política local. O bom desempenho repetiu-se em São Pedro da Aldeia, Arraial do Cabo e Iguaba Grande. O crescimento também beneficiou candidatos ligados a igrejas neopentecostais, como a Igreja Universal do Reino de Deus e a Assembleia de Deus, entre eles o ex-deputado Eduardo Cunha, hoje preso por crimes investigados pela Operação Lava Jato.

Para o historiador Paulo Roberto Araújo, diferentemente do que acontece na Europa e nos Estados Unidos, que se debatem sobre questões econômicas, o conservadorismo no Brasil, em especial, no interior, tem a ver com princípios morais e comportamentais.

– Uma das instituições mais importantes para sociabilidade daqui que e a família, eles sentem que isto está sob ameaça. Presta atenção nas pautas de grupos em redes sociais. Olha os membros destes grupos que moram aqui na região. É como se a família fosse uma cidadela sitiada, sob ameaça, do libertarianismo, do ateísmo e do comunismo – analisa.

O cientista político Márcio Malta, da Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF) enxerga o assunto sob outro ponto de vista. O estudioso salienta que a tendência é mundial, mas que no Rio tem a ver com resistência às mudanças sociais. 

– Apesar dos avanços sociais tímidos nos últimos governos, houve resistência a esse avanço. As elites não querem ceder um milímetro. O Rio historicamente é muito conservador. Inclusive, diversos municípios resistiram ao fim da escravidão. Mas o que se vê agora é que a direita se expõe mais. Se antes havia receio, agora as pautas ganham mais força.  E essa plataforma é usada como capital político – reforça.

Já para o também historiador Paulo Cotias, o discurso adotado pelos políticos locais é uma ‘estratégia de sobrevivência’.

– O conservadorismo aqui funciona como um verniz para encobrir o que realmente são os desejos da classe política: poder, prazer e dinheiro. O eleitor partilha desse jogo unindo o útil ao agradável. Aceitam que os donos do poder se perpetuem em troca de que qualquer benefício que recebam não se alterem. E claro, quando o verniz da classe política descasca é necessário buscar algo teatralmente mais radical para os mesmos fins – destaca.

“Tempos difíceis” – Para muitos, apesar dos 26 anos de mandato sem feitos significativos, o deputado Jair Bolsonaro bem poderia ser chamado pelo seu nome do meio: Messias. Afinal, é visto pelos simpatizantes como alguém que poderia representar o ‘novo’ a botar ordem na ‘bagunça do país’. Assim pensam os dirigentes do Partido Ecológico Nacional (PEN), prestes a mudar para o simbólico nome de Patriotas.

Em litígio no PSC, o capitão reformado do Exército vai mudar de legenda em breve. O presidente municipal do PEN de Cabo Frio, Léo Capone, esfrega as mãos e descarta que o discurso extremista do pré-candidato possa assustar o eleitorado.

– Sempre defendi uma renovação. E a renovação quer dizer a mudança do que está lá. Toda renovação gera dúvida. Por ele ser bem radical, existe um pé atrás. Mas ele já está mudando em relação a algumas posturas. Nem Jesus agradou a todos – comentou.

Entre os grupos historicamente discriminados da sociedade, a atual situação não poderia desagradar mais. A professora de História e integrante do Coletivo Griot Pesquisa, Difusão e Memória em Tradições Afro, Andreia Fernandes, define os tempos atuais como ‘sombrios’.

– Estamos vivendo momentos muito difíceis. Parece que o errado está sendo aceito como certo. É visto como 'mimimi'. A gente vinha avançando a passos curtos, mas agora o retrocesso atinge as bases. E quem se ferra é quem já está ferrado, que são os quilombolas, os negros, os povos indígenas e o pessoal da periferia – dispara.

O presidente do Fórum LGBT da Baixada Litorânea, Rodolpho Campbell, não espera facilidades para o segmento que representa.

– Confesso que o cenário nacional e estadual é assustador, e que infelizmente tende a piorar visto que toda essa estratégia nefasta está sendo montada com fins eleitorais futuros e isso tende a acirrar gradativamente. Contudo, aqui na região, o cenário ainda é mais leve, visto que nossas agendas foram recebidas com resistência num passado não muito distante, mas mostramos categoricamente que elas não feriam e não atacavam ninguém – afirma.