Jandira

Entrevista Jandira Feghali: 'argumento é mentiroso'

Deputada diz que déficit apregoado pelo Governo é farsa e crê que Câmara barre Reforma da Previdência

16 MAR 2017 • POR Rodrigo Branco I Foto: Divulgação Câmara (Nilson Bastian) • 02h04

Uma das maiores opositoras à Reforma da Previdência preten­dida pelo Governo Federal é a deputada federal Jandira Fegha­li (PC do B-RJ). Única mulher a compor a Comissão Especial que trata do tema, Jandira está otimista que a proposta não vai passar, pelo menos com o texto original, pelo Congresso, sobre­tudo pela fragilidade política do núcleo de poder do presidente Michel Temer (PMDB) e pela adesão à paralisação nacional realizada ontem em todo o país.

Em entrevista à Folha, a depu­tada afirma que as mudanças nas regras da aposentadoria seriam especialmente cruéis com traba­lhadores rurais e mulheres, que já possuem sobrecarga de trabalho, levando-se em conta as tarefas domésticas. Jandira disse ainda que é ‘mentiroso’ o argumento de que a Previdência está falida.

– Para tentar justificar o injus­tificável, o Executivo afirma que a Previdência tem um déficit de R$ 86 bilhões. Essa conta, no entanto, leva em consideração somente contribuições dos tra­balhadores e empresas. O regi­me previdenciário no Brasil é tripartite. A contribuição do go­verno é uma obrigação. Somen­te poderíamos falar de déficit se fosse necessário cobrir mais de 33% das despesas. Em 2015, essa conta ficou muito menor, foi de 18%. A previdência não tem déficit, esse governo é que pretende desviar esses recursos para outros fins – alega.

Folha – A senhora diz que o argumento de que a Previdência é deficitária é falso? Por que?

Jandira – O argumento do déficit é mentiroso. Todo mundo sabe que a Previdência é supe­ravitária. O argumento do déficit é usado para gerar o terrorismo: “Oh, sem a reforma quebra o país”. Não é verdade. O pro­blema da Previdência não é a Previdência, o problema da Pre­vidência é a economia. É gerar emprego, é superar a sonegação de R$ 456 bilhões à Previdência, é acabar com essa desoneração, é cobrar Dívida Ativa. Não é a regra da Previdência que é o pro­blema.

Folha – A senhora é a úni­ca mulher na Comissão que debate a Reforma. O que essa mudança afetaria diretamente as mulheres?

Jandira – Quando iguala a idade de homens e mulheres é pior ainda porque 90% do tra­balho doméstico é feito por elas. Nós temos uma jornada de tra­balho maior, um salário menor e uma precarização dos direitos trabalhistas muito maior.

Folha – Após a divulgação da lista do procurador-geral Ro­drigo Janot, que envolve cinco ministros, o governo Temer re­úne condições políticas para le­var essa reforma adiante?

Jandira – Nem condição política, nem condição ética, nem legitimidade para propor mudanças constitucionais no Brasil e o pacto que ele não tem condições de fazer. É um governo sem nenhuma credi­bilidade. Diria que a cara da República está muito feia, quando a gente vê Alexandre de Moraes no Supremo; ele no Planalto; e uma parcela desse Congresso, que além do envolvimento com problemas éticos também não tem nenhum compromisso com a sociedade brasileira.

Folha – O presidente da Co­missão Especial é o deputado Carlos Marun (PMDB-MS) é aliado de primeira hora do ex-presidente da Câmara, Edu­ardo Cunha, hoje preso...

Jandira – Tenho brincado que o Parlamento faz mal à saú­de. Está difícil de vivenciar dia­riamente os discursos e o tipo de atuação de boa parte desse Con­gresso. Mas a gente está aqui para defender o que acredita e o povo brasileiro naquilo que a gente acha que é correto.

Folha – As manifestações desta quarta podem ter algum efeito prático para barrar a Reforma?

Jandira – Hoje (ontem) foi um marco histórico como o dia 8 de março também foi e está au­mentando muito a mobilização para dentro da base dos depu­tados. Eles estão para as ci­dades onde os deputados são votados para fazer a divul­gação e cobrar a posição do deputado sobre a Reforma da Previdência. Esse movimen­to e essa pressão vão ajudar muito. Essa Reforma já não passa como está hoje. Tem divisão na base do governo. Eles não têm maioria pra pas­sar, precisam de 308 votos. Eles podem fazer algumas mudanças periféricas, mas não resolve o problema. Nós temos que der­rotar a proposta. Ela não pode ir adiante porque ela é absoluta­mente desumana e prejudicial às mulheres e aos trabalhadores de baixa renda.

O que muda nas regras de aposentadoria com a Reforma da Previdência:

Idade Mínima para aposentadoria

Hoje: mulheres – 55 anos; homens – 60 anos

Com as mudanças: homens e mulheres – 65 anos

Anos de contribuição

Hoje: mínimo de 15 anos

Com as mudanças: mínimo de 25 anos

Ao completarem contribuição, quanto receberão

Hoje: 100% do salário

Com as mudanças: 100% do salário apenas com 49 anos de contribuição; abaixo disso, 73%

Salário-maternidade para agricultora familiar

Hoje: 10 meses de comprovação antes da gravidez

Com as mudanças: 12 meses de comprovação antes da gravidez

Auxílio-doença

Hoje: 10 meses de comprovação antes do ocorrido

Com as mudanças: 12 meses de comprovação antes do ocorrido

Trabalhadores rurais

Hoje: Idade mínima de 55 anos para as mulheres e de 60 anos para os homens; mínimo de 15 anos de trabalho no campo

Com as mudanças: Passam a contribuir para o INSS, sob as mesmas regras do regime geral