Coluna desta quarta-feira (25): Direito de resposta e meio termo
O jornalista Rodrigo Cabral fala sobre a tentativa de amedrontar a imprensa
A ameaça veio por telefone. Suspeita de bomba na sede do jornal Estado de S. Paulo. Em questão de minutos, prédio totalmente esvaziado. Medo. Afinal, a carnificina em Paris anda recente na memória. Foi na tarde desta segunda. Durou apenas alguns minutos. Tempo suficiente para a polícia fazer a varredura e liberar o local. Nenhuma bomba foi encontrada.
A ameaça vem do Congresso. Suspeita de mais uma tentativa de cerceamento da liberdade de expressão. A presidente Dilma Rousseff sancionou projeto que regulamenta o direito de resposta. Foi no início deste mês. Desta vez, não é alarme falso. Essa bomba estourou – e caiu no colo da imprensa. Como tem se tornado regra, onde tem faísca tem Eduardo Cunha. Ele gostou da novidade. O deputado das contas da Suíça se valerá da nova regulamentação para responder a reportagem do jornal O Globo.
Na prática, funciona assim: a empresa ou pessoa ofendida tem prazo de 60 dias para apresentar ao órgão de comunicação o pedido de direito de resposta. O juiz, em até 24 horas, aciona o veículo para que apresente seus argumentos. A sentença sai em até 30 dias. O efeito suspensivo só pode ser concedido por decisão colegiada de um tribunal.
Para a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), o rito contraria o funcionamento do Poder Judiciário. Para a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), prazos tão enxutos tornam tarefa quase impossível recorrer da decisão.
Preocupante.
A lei vilaniza os veículos de comunicação – quase que tolhendo a jornalistas, articulistas e empresários do ramo a presunção de inocência e outorgando-lhes uma pecha inerente ao exercício da profissão, a falsa ideia de que estão predispostos a assassinar reputações. Cabe lembrar o caso de uma repórter da Folha de S. Paulo, processada simultaneamente por filiais de uma igreja em diferentes estados dificultar seu comparecimento perante a Justiça. Se gente interessada em amordaçar a mídia já lança mão de artifícios como estes, a nova lei representa para este grupo escuso um presente de Natal antecipado.
Para a democracia, um presente de grego. Ruim para a grande mídia; pior ainda para a imprensa regional, cujo aparato de defesa é muito mais frágil.
Apenas um ponto do texto foi vetado: o que dizia que o ofendido “poderá requerer o direito de dar a resposta ou fazer a retificação pessoalmente”. Embora a Constituição já assegure o direito de resposta proporcional ao agravo, a nova regulamentação vem no vácuo deixado pela revogação, em 2009, da Lei de Imprensa, pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
E é lá, no STF, que a questão voltará a ser discutida. Embora sem tecer muitos comentários, o ministro Edison Fachin antecipou que o tribunal terá de encontrar um meio-termo, de forma que a liberdade de imprensa não seja cerceada e o direito de resposta de quem for ofendido seja garantido.
É por aí. Em época de extremismos, este tal meio-termo parece um bem inalcançável. Ele, no entanto, há de se sobrepor à ganância terrorista que é o desejo de se ter uma imprensa amedrontada. É guerra.