MPF aciona governo de Cabo Frio para cessar poluição em Comunidade Quilombola de Maria Joaquina
Ação pede medidas urgentes para impedir lançamento de esgoto, reparação integral dos danos ambientais e indenização mínima de R$ 1,2 milhão
O Ministério Público Federal (MPF) ajuizou ação civil pública, com pedido de tutela de urgência, para obrigar o município de Cabo Frio (RJ) a adotar medidas imediatas e definitivas para cessar o despejo irregular de esgoto no Brejo da Flexeira, área que integra o território da Comunidade Quilombola de Maria Joaquina. Segundo o órgão, as obras de manilhamento realizadas pela prefeitura e as inúmeras ligações clandestinas de esgoto conectadas à rede de drenagem pluvial têm provocado grave poluição no local, afetando diretamente o modo de vida e a atividade de pesca tradicional da comunidade.
A ação, assinada pelo procurador da República Leandro Mitidieri, decorre de inquérito civil instaurado após representação recebida em março de 2023, relatando que a rede de drenagem instalada pelo município estaria sendo utilizada para lançamento de esgoto doméstico por moradores e comerciantes da região. Ao longo de mais de dois anos de apuração, diversas reuniões e visita no local foram promovidas pelo MPF com representantes municipais e da comunidade, além de vistorias técnicas realizadas em conjunto com a Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro (DPRJ).
Os documentos reunidos no procedimento demonstram que, apesar de compromissos assumidos e de medidas pontuais adotadas pela prefeitura – como notificações, vistorias, instalação de alguns sistemas individuais de tratamento e aquisição de equipamentos – as ações foram insuficientes para cessar a poluição. Laudo técnico da Defensoria Pública, datado de novembro de 2024, identificou a persistência de ligações clandestinas e observou que o brejo “continua recebendo esgoto”, inclusive com presença de produto químico na tubulação.
O MPF destaca, na ação, que a omissão da administração municipal compromete direitos fundamentais da comunidade, caracterizando situação de “racismo ambiental”, uma vez que a destinação irregular do esgoto ocorre justamente na área ocupada historicamente pelo grupo tradicional. Para o órgão, a conduta do município evidencia invisibilidade estrutural e violação dos direitos fundamentais da comunidade tradicional e ao dever constitucional de proteção ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.
Diante do quadro, o MPF requer que a Justiça Federal determine, em caráter liminar, a remoção imediata de todas as ligações clandestinas de esgoto da rede pluvial e a realização de ações de limpeza e despoluição total do Brejo da Flexeira, com comprovação das medidas no prazo de 90 dias. No mérito, pede que o município seja obrigado a desfazer as obras de manilhamento irregulares e implementar solução adequada e definitiva para o esgotamento sanitário do bairro, com construção de rede separativa que impeça novo despejo no território quilombola.
Além da reparação integral dos danos ambientais, mediante apresentação e execução de plano de recuperação de área degradada (PRAD), o MPF requer indenização por danos morais coletivos em valor não inferior a R$ 1,2 milhão, a ser revertido em parte ao Fundo de Direitos Difusos e em parte à associação representativa da comunidade, para aquisição de equipamentos de pesca.
Como alternativa à indenização, o órgão pede que sejam avaliadas medidas compensatórias sugeridas pela própria comunidade, no mesmo valor, incluindo a implantação de tanques de piscicultura, a construção de restaurante comunitário, a instalação de forno para produção cerâmica e programas de educação ambiental. Até a publicação dessa matéria a Prefeitura de Cabo Frio ainda não havia se pronunciado.