Eleição do Conselho de Patrimônio, em Cabo Frio, é contestada e vai parar no Ministério Público
Secretário de Cultura nega existência de ilegalidades e diz que tudo foi feito dentro da Lei
A eleição dos novos membros do Conselho Municipal do Patrimônio Artístico e Cultural de Cabo Frio virou alvo de denúncia no Ministério Público. A acusação é de suposta manipulação nas novas nomeações (feitas no início deste mês de junho), intransparência de informações públicas, e arbitrariedade na composição do conselho feitas pela atual gestão da Secretaria de Cultura de Cabo Frio. A denúncia, assinada pelo deputado estadual Flávio Serafini, tem como alvos a Prefeitura de Cabo Frio e a Secretaria de Cultura.
No documento, que a Folha teve acesso, o deputado narra que o conselho existe desde 1981, e não é apenas consultivo, mas também deliberativo. Diz ainda que todo imóvel localizado em Cabo Frio, que tenha mais de 50 anos, e que venha a ser modificado, ou demolido, passa por esse conselho para ter analisado seu valor histórico e cultural.
– Dentro do CMUPAC se elege o diretor do Instituto Municipal do Patrimônio Cultural (IMUPAC), órgão municipal de tombamento. A composição do conselho acontece a cada dois anos, e não é paritária (como deveria ser): são cinco nomes titulares e cinco suplentes de órgãos da Prefeitura nomeados pelo próprio prefeito, três indicados de instituições de patrimônio (IPHAN, INEPAC e IBRAM), e tem a eleição de membros de três instituições organizadas da sociedade civil. Para eleição de membros da sociedade civil no Conselho há aberto um prazo de inscrições – normalmente de um a dois meses – e com ampla publicidade nos canais da Prefeitura, e envio para imprensa local, para que a sociedade e instituições interessadas tenham ciência - explicou o deputado.
Segundo Serafini, o prazo da última gestão bianual terminava no fim de fevereiro deste ano, e uma nova eleição deveria ter acontecido em março. Ele lembra que desde o dia 15 de janeiro a Associação Cabo Frio Solidária, que tinha sido eleita com a vice-presidência do conselho na última gestão, vinha questionando quando seria a eleição da sociedade civil.
– A Secretaria de Cultura não convocou nenhuma reunião, não convocou nenhuma das instituições da sociedade civil do conselho para organizar o processo de eleição. Sem nenhuma transparência, publicidade, e nenhuma convocação ou notificação aos membros da sociedade civil que compunham o CMUPAC, o edital da eleição foi publicado no dia 28 de maio, somente no Diário Oficial da Prefeitura. Não consta nenhuma outra publicação em nenhum outro veículo oficial de divulgação da Prefeitura, em nenhuma aba do Conselho de Patrimônio no próprio Portal da Prefeitura, em nenhuma rede social da Prefeitura ou Secretaria de Cultura, em nenhum veículo de imprensa - revelou o deputado, alegando, ainda, que o prazo de inscrição, além de não ter sido divulgado para sociedade civil, foi relâmpago: quatro dias apenas, com eleição no dia 1º de junho.
Na denúncia apresentada ao Ministério Público, o deputado pede a anulação imediata da posse dos novos membros do Conselho Municipal de Patrimônio Artístico e Cultural de Cabo Frio, e marcação de nova eleição para membros da sociedade cívil com ampla divulgação.
SECRETÁRIO DIZ QUE DENÚNCIA É INFUNDADA E AFIRMA TER CUMPRIDO A LEI
Em resposta aos fatos apresentados pelo deputado Flávio Serafini, o secretário de Cultura de Cabo Frio, Carlos Ernesto Lopes (o Carlão), disse à Folha que “a denúncia é objeto de uma informação totalmente inverídica e tendenciosa”.
– A Secretaria Municipal de Cultura está sempre acessível a prestar informações, todas as vezes que for instada a falar. As respostas são imediatas e sem maiores delongas. Segundo consta da legislação municipal, “o Conselho Municipal de Patrimônio é um órgão colegiado de caráter permanente, consultivo, deliberativo e de assessoramento ao Poder Executivo, destinado a orientar, acompanhar e fiscalizar a política municipal de proteção e valorização do patrimônio cultural”, tudo previsto no art 2º da lei 3309/21 que reestruturou o CMUPAC e revogou leis anteriores sobre o tema - afirmou Carlão.
O secretário explicou ainda que a participação neste Conselho difere um pouco dos demais, previstos pela legislação e obrigatórios, “pois como sabemos este conselho tem suas competências voltadas à proteção dos valores culturais e proteção de nosso patrimônio material e imaterial. Assim não há paridade e nem conceito de sociedade civil e governo, mas entidades participantes”.
Folha - Qual foi o processo adotado pela Secretaria de Cultura para a escolha dos representantes da sociedade civil no Conselho Municipal de Patrimônio (CMUPAC) neste ano?
Carlão - Seguimos o processo da legalidade, transparência e publicidade, onde o primeiro passo foi publicar o edital de convocação, que ficou aberto de 28/05 a 01/06 para as três vagas de entidades “profissionais, acadêmica ou de pesquisa”. Como não houve inscrições, no dia 05, que seria o dia de publicar a relação das entidades inscritas, publicamos o resultado no Diário Oficial nº 1235, mencionando nosso uso do direito de convidar entidades a compor o CMUPAC, uma vez que não houve inscritas.
Folha - Por que a Secretaria de Cultura optou por não realizar uma eleição aberta para a escolha dos representantes civis, conforme previsto em regulamento ou legislação vigente?
Carlão - Na verdade, essa não é uma informação correta. Nós optamos por realizar eleições, mas não tivemos inscrições. O Conselho não pode funcionar com um convite pessoalizado e sem transparência, feito para que algumas entidades se inscrevam a partir de nosso direcionamento. Poderíamos ter feito isto, mas não fizemos porque acreditamos que as inscrições aconteceriam naturalmente. E, todas as inscritas seriam tratadas com isonomia. Sem inscrições passamos a tratar o tema conforme facultado pelo edital.
Folha - O Edital publicado no Diário Oficial em 28 de maio foi amplamente divulgado? Onde? Quais foram os canais utilizados para comunicação e divulgação à população e aos interessados além do Diário Oficial?
Carlão - O canal oficial para a comunicação é sempre o Diário Oficial do município. Isto significa amplamente divulgado, porque é uma obrigação dos ativistas e dos cidadãos esse acompanhamento às publicações do Diário Oficial.
Folha - Houve algum contato ou comunicação direta com os membros da sociedade civil que faziam parte do Conselho anterior?
Carlão - A Secretaria de Cultura responde pessoalmente a todos que fizerem contato, sendo ou não membros de conselhos anteriores. Sempre foram prestadas as informações solicitadas e com o conteúdo inerente à pergunta.
Folha - Como a Secretaria de Cultura justifica o prazo tão curto (apenas quatro dias) para as inscrições?
Carlão - Não há um prazo mínimo estabelecido em Lei. É um procedimento que depende de vários fatores, pois só acontece eleição para três membros do inc. IV do art 5º da Lei 3309/21. Não fosse apenas isto, entendemos que nosso ‘deadline’ era 30/05 para iniciar a convocação. Fizemos dois dias antes. Então, cumprimos nossa meta. Não vemos como dificuldade. Vemos como insurgência de uma entidade em específico que perdeu o prazo e resolveu polemizar algo que foi realizado com lisura e transparência.
Folha - Qual o critério adotado para a seleção das instituições que passaram a compor o conselho, uma vez que, segundo a denúncia, nenhuma inscrição foi recebida?
Carlão - O único critério é a Lei. Não tivemos inscrição e usamos o poder discricionário conferido pelo Edital. Convidamos uma associação profissional, uma acadêmica e uma de pesquisa. Como lidamos com patrimônio material e imaterial é importante a representatividade de segmentos historicamente excluídos também. Então o convite foi para a Asaerla, UENF e Griot, Pesquisa Memória e Tradições Afrobrasileiras.