RESISTÊNCIA

Casa de Referência Inês Etienne Romeu segue sob risco de despejo em Cabo Frio

Mesmo com reintegração suspensa no último dia 18, integrantes do Movimento Olga Benário permanecem em vigília; espaço acolhe mulheres vítimas de violência

25 ABR 2025 • POR Redação • 14h13

Integrantes do Movimento de Mulheres Olga Benário, em Cabo Frio, intensificaram as ações de resistência para impedir a reintegração de posse da Casa de Referência Inês Etienne Romeu. A ação, que estava marcada para o último dia 18, não chegou a acontecer, mas segundo informações, o risco de despejo permanece e pode ser executado a qualquer momento. Para evitar que isso aconteça, membros do grupo seguem em vigília permanente, mantendo a casa aberta e funcionando 24 horas. Uma plenária de apoio também foi marcada para a última terça-feira (22), às 18h30.

O imóvel, localizado no bairro Itajuru, foi ocupado pelo movimento de mulheres em novembro de 2023 em meio a uma queda de braço com o antigo governo municipal. Abandonado por mais de uma década, foi totalmente reformado pelo grupo com ajuda de doações. Desde então, oferece (de forma gratuita) orientação jurídica e psicológica, oficinas de autonomia financeira, cozinha comunitária e até uma horta coletiva como forma de acolher mulheres em situação de violência.

No início deste ano, no entanto, a prefeitura notificou o grupo extrajudicialmente pedindo para que desocupasse o local. O prazo venceu em 4 de fevereiro, mas a ocupação continuou. À Folha, o governo municipal disse, na época, que a casa foi desapropriada com base no Decreto Municipal nº 6.596, de 19 de julho de 2021, “que declarou sua utilidade pública para fins de preservação e conservação ambiental”. Informou também que “a desapropriação ocorreu com urgência, uma vez que são necessárias obras essenciais para a conservação do espaço”, e garantiu que o pedido de desocupação “tem como objetivo garantir a proteção da área e sua adequada utilização pela população”. A justificativa não foi aceita pelas integrantes do movimento, que desde a semana passada passaram a fazer manifestações públicas com o objetivo de tentar impedir a reintegração de posse.

Dois dias antes do prazo para reintegração de posse, o movimento de mulheres ocupou o prédio da Prefeitura de Cabo Frio, e criticou o fato de o despejo ter sido marcado para o feriado da sexta-feira santa.

– Estamos aqui exigindo um posicionamento sobre o despejo covarde da ocupação de mulheres Inês Etienne Romeu. A prefeitura prepara uma grande festa para a cidade, mas para as mulheres é repressão com força policial. Ocupamos a prefeitura porque o prefeito se negou a nos atender. E só depois da mobilização fomos procuradas pela procuradora e pela secretária da mulher. Vamos participar de uma reunião, e se não houver um posicionamento positivo, vamos ocupar a Câmara e continuaremos resistindo - explicou Chantal Campello, uma das líderes no grupo.

Sem a resposta positiva que espera, o movimento iniciou, no dia 18, uma vigília em defesa da Casa de Referência Inês Etienne Romeu. Durante a ação, Chantal denunciou que Cabo Frio é a cidade com o maior número de casos de violência contra a mulher na Região dos Lagos, registrando diversos casos de feminicídio por ano. O mais recente é o assassinato de Karolina Sales, de 23 anos. Ela foi morta a facadas dentro de casa, no bairro Vila Nova, na manhã do último dia 16. O crime aconteceu na frente do filho dela, um bebê de apenas oito meses. O principal suspeito é o companheiro de Karolina: ele teria sido flagrado por câmeras de segurança deixando o local do crime, e fugindo a pé logo após o ataque. Desde então, está foragido.

Após este caso, o grupo postou um comunicado nas redes sociais. No texto, o movimento diz que “em meio a esse cenário alarmante, a Casa de Referência da Mulher Inês Etienne Romeu tem sido extremamente importante para mulheres vítimas de violência, oferecendo apoio psicológico, jurídico e social. No entanto, o prefeito Serginho quer acabar com a única casa de referência para mulheres da cidade, alegando que o imóvel deve ser desapropriado para fins de preservação ambiental. Essa decisão coloca em risco um espaço vital que já acolheu diversas mulheres em situação de vulnerabilidade. Não podemos permitir que o espaço seja fechado. Em uma cidade onde a violência contra a mulher é uma realidade diária, é fundamental fortalecer, e não desmantelar, iniciativas que oferecem suporte e proteção. Exigimos respeito pela vida das mulheres”.

– Na sessão da câmara os vereadores gastaram seu tempo de tribuna para falarem sobre como estão sensibilizados com o abalo do prefeito sobre a incursão da Polícia Federal na casa dele, e não falaram absolutamente nada sobre o feminicídio da cidade, nem da situação da ocupação das mulheres. Em nenhum momento a Prefeitura de Cabo Frio se posicionou contra mais esse feminicídio. Continuaremos ocupando as ruas, ocupando imóveis públicos que não cumprem nenhuma função social. Continuaremos ocupando a Prefeitura, e não nos intimidaremos com essa meia dúzia de homens brancos, engravatados, que querem ver a gente morta - declarou Chantal.

A Casa Inês Etienne Romeu é o único espaço de Cabo Frio com atendimento gratuito e contínuo para mulheres em situação de violência. O nome do espaço é uma homenagem à única sobrevivente da Casa da Morte, um centro de tortura da ditadura militar brasileira.