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MPF convoca nova reunião sobre engorda de praias lagunares na Região dos Lagos

Assunto vem sendo debatido após denúncia de que areia utilizada estaria contaminada

2 JAN 2024 • POR Cristiane Zotich • 16h55

Está marcada para o dia 8 de janeiro, às 10h, na sede do Ministério Público Federal, em São Pedro, uma segunda reunião sobre a engorda das praias da Lagoa de Araruama. Segundo o procurador da República, Leandro Mitidieri, disse à Folha, esse novo encontro servirá para que novos esclarecimentos sejam prestados sobre o assunto.

A primeira reunião aconteceu no último dia 18 de dezembro, e foi convocada após a equipe do deputado estadual Flávio Serafini (Psol) ter protocolado denúncia no Ministério Público Federal no começo de novembro. Na edição impressa de 10 a 16 do mês passado a jornal havia noticiado que o Instituto Estadual de Meio Ambiente (Inea) e a Prefeitura de São Pedro estavam sendo acusadas de favorecer a construção de um residencial de forma irregular, além de autorizar fechamento de uma via pública e abertura de outra às margens da Lagoa de Araruama, no bairro aldeense do Baixo Grande.

– Antes do projeto de dragagem do Estado e Inea, já havia licença do atual governo aldeense, desde 2021, para aterro na praia do Baixo Grande. A autorização passou pelos secretário de Planejamento e Obras e secretária de Meio Ambiente da época, Fernando Frauches e Raquel Trevizam. A criação do novo logradouro nem passou pela Câmara dos Vereadores de São Pedro. Existia apenas na maquete do empreendimento. Ou seja, se não houvesse engorda do governo estadual e licença do atual governo municipal, não haveria nova rua construída pelo empreendimento onde antes era água da lagoa, ferindo a faixa marginal – denunciou Lucas Muller, assessor do deputado Flávio Serafini, na reunião do último dia 18 com o Ministério Público Federal.

Outro ponto que gerou a convocação da reunião foi a recente entrevista feita pela Folha com Adacto Ottoni, professor associado do Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental da Universidade Estadual do Rio de Janeiro. Na matéria, publicada na edição impressa do dia 8 a 14 de dezembro, ele denunciou que a dragagem estaria contaminando as águas da Praia do Forte. 

Um dia após a publicação da reportagem, o Ministério Público Federal recomendou a paralisação da dragagem, e também a suspensão do aumento da extensão da faixa de areia (“engorda”) das praias lagunares, até que os impactos ao meio ambiente, à saúde humana, ao patrimônio imobiliário da União e aos pescadores locais sejam devidamente esclarecidos. Requisitou ainda ao presidente do Inea, aos prefeitos e aos secretários municipais de Meio Ambiente de Cabo Frio, Arraial do Cabo e São Pedro da Aldeia, informações sobre os exames de coliformes fecais e totais ou de Escherichia Coli (bactéria que pode causar infecções) na areia dragada que está sendo usada para o engordamento das praias. Os gestores devem ainda apresentar estudo prévio, emitido por órgão competente, sobre os impactos ocasionados pela intervenção na Faixa Marginal de Proteção (FMP) da Lagoa de Araruama e nos locais reivindicados pelos pescadores.

Da reunião, o procurador Leandro Mitidieri disse que saiu um acórdão notificando o Inea para que sejam feitas coletas de amostras de qualidade da água em pelo menos três pontos da Lagoa de Araruama em Cabo Frio: um pouco antes do local da dragagem, outro no ponto de dragagem e o terceiro saída do Canal de Itajuru com o mar.
– A coleta deve ser feita sempre na parte da manhã, com intervalo máximo de 50 minutos antes e depois da maré de baixa-mar, e ao mínimo duas vezes por mês – informou Mitidieri.

À Folha, o Inea disse nesta quarta-feira (27) que ainda não havia sido notificado sobre esse acórdão do MPF. Informou também que monitora a situação de dragagem no local, por meio de um laboratório privado, e que o monitoramento da qualidade da água na Lagoa de Araruama é feito de forma sistemática, obedecendo aos critérios específicos para a amostragem, conforme o Procedimento Operacional Padrão (POP- INEA-GELAB-215) e Resolução CONAMA N°274/2000. No entanto, segundo o professor Adacto Ottoni, que também participou da reunião no MPF, não é correto utilizar a Resolução CONAMA no monitoramento da qualidade de água na lagoa. Ele criticou ainda a ausência de parâmetros que determinem se a areia da dragagem está ou não contaminada.

– A coleta de amostra de areia não tem nenhuma metodologia. Mas a Prefeitura do Rio de Janeiro tem uma norma. Apesar de não haver uma metodologia internacional, podemos adotar a norma do município do Rio para se ter uma referência, porque o que é importante na Resolução CONAMA são os agentes químicos, metais pesados e pesticidas, que são coisas que não têm na Lagoa de Araruama. Aqui a principal poluição é o esgoto. Por isso o órgão ambiental tem que analisar a fonte da poluição: tem que fazer a colorimetria e usar como parâmetro a norma da Prefeitura do Rio, que define que a partir de certo valor de colorimetria, a areia está imprópria. É disso que precisamos aqui – defendeu o professor.

No que se refere aos três pontos de monitoramento da água sugeridos pelo MPF no acórdão, o Inea destacou que já costuma fazer coletas nesses pontos. Em 2022, segundo o órgão, foram realizados monitoramentos em 18 datas, enquanto em 2023 foram 17 até o último dia 27, totalizando 35 amostragens, “das quais 25 ocorreram com a maré baixa e 10 em maré alta”. Esclareceu ainda que a coleta acontece pela manhã, de acordo com o plano de amostragem, responsável por administrar a logística do processo desde a coleta até a análise, abrangendo “todos os tipos de condições ambientais às quais os banhistas estão expostos”. 

De acordo com o site do Inea, a última coleta foi realizada no dia 13 de dezembro. Nesta data estavam impróprios para banho todo o trecho da Praia do Siqueira, a orla das Palmeiras em frente ao Quiosque Azul, e também o trecho em frente à Pousada Recanto da Passagem, que fica um pouco antes da área de dragagem na Ilha do Japonês, justamente um dos três pontos que fazem parte do acórdão do Ministério Público Federal.