DIÁLOGOS

Flávio Rosa: "Não existe Turismo se o morador não estiver satisfeito para receber o turista"

Futuro secretário de Turismo, Esporte e Lazer de Cabo Frio fala dos planos para gestão, diz que foco é qualidade de vida e prega importância da integração com municípios vizinhos

19 DEZ 2020 • POR Rodrigo Branco • 11h51
Tiziu demonstrou confiança em Bonifácio: "nossa liderança, nosso presidente, nosso capitão do time" - Reprodução

Se o anúncio do secretariado de José Bonifácio fosse a convocação para uma seleção, a escolha de Flávio Rosa para a nova pasta de Turismo, Esporte e Lazer seria uma das que mais se aproximariam da unanimidade da ‘torcida’. A boa expectativa, contudo, vem junto com a grande responsabilidade de tocar uma das principais pastas de um município cheio de atrativos naturais, mas que sofre com a deterioração da infraestrutura urbana. Para a temporada 2020-2021, há ainda a preocupação adicional com a pandemia da Covid-19.

Advogado de formação, mas com reconhecida atuação no segmento esportivo da cidade ao longo de décadas, Flávio Rosa, popularmente conhecido como Tiziu, abusou das metáforas futebolísticas para dimensionar o tamanho o desafio de assumir duas secretarias em uma, em plena alta temporada (“é como jogar sem aquecimento, disse”). A preocupação, ele antecipa, é melhorar a qualidade de vida não apenas para receber os visitantes, mas para a população em geral.

Nessa entrevista à Folha, o futuro secretário falou dos planos para a gestão; comentou sobre o convite de Bonifácio, a quem se referiu como ‘capitão do time’; defendeu o Turismo regional e antecipou qual a ‘grande jogada’ que vislumbra em relação à reforma dos espaços esportivos da cidade.

– Vou me dedicar integralmente, junto com a minha equipe, ao Complexo Olímpico Aracy Machado, que é o sonho de várias gerações em Cabo Frio. Esse é o gol de placa. Vou tentar fazer esse gol de placa – almeja.

Folha dos Lagos – O que José Bonifácio pediu a você ao te convidar para ser secretário?

Flávio Rosa – José Bonifácio sempre cumpre o que ele promete. E uma das coisas é colocar a folha de pagamento em primeiro lugar, porque é constitucional, e ela está extrapolando. Por isso, ele precisa fazer uma reforma administrativa. Talvez depois da pandemia, isso se desfaça, mas nesse momento foi necessária essa integração entre Turismo, Esporte e Lazer. Como eu sou um amigo dele de longa data, desde 1992, ele acabou entendendo que precisava de mim principalmente nessa junção. Primeiro, porque eu tenho no Esporte uma área de conforto, que eu entendo bem. Lidei com isso a vida toda, em várias modalidades e já fui secretário dele, que na verdade não era secretaria, mas tinha status. Trabalhei com ele o tempo todo e teve uma grande aprovação. Mas o desafio era maior, porque ele entendeu que Turismo, Esporte e Lazer tinha que estar juntos nesse primeiro momento. E aí, ele me chamou para sair da zona de conforto, para enfrentar esse novo tema, que na verdade não é estranho para mim. Eu não sou da área hoteleira, sou da área jurídica. Mas já vivi isso, fui advogado das pousadas. Mas, fora isso, eu sou um cidadão usuário desses serviços. Falei outro dia para o pessoal do trade, que talvez eu seja a peça que esteja faltando. Alguém pode criticar “ah, ele não é do ramo”, mas eu aprendo rápido e me dedico muito. Acho que eles entenderam a minha intenção e viram a minha vontade de fazer um bom trabalho para minha cidade.

Folha – E o que o segmento hoteleiro pediu para você? O que você pode dizer dessas conversas iniciais?

Rosa – Em primeiro lugar, eu queria agradecer ao Manoel Vieira (atual secretário de Turismo e Cultura), que eu senti que é um profissional dedicado, com experiência e tem muito boas intenções. Já vejo uma evolução no trabalho dele e de outros. O importante é isso: o que é bom tem que continuar, e a gente quer implantar nosso projeto. Ele tem me recebido muito bem. O que conversamos com os agentes ligados ao Turismo é que falta um pouco de divulgação, de ações de marketing, que precisam ser mais pujantes para chegar a outros lugares. A preocupação maior deles, como a nossa, é esse momento terrível que vivemos, que é a questão da pandemia, e com o momento crítico vai ser a partir de 26 de dezembro, quando a cidade começa a receber um grande número de visitantes. E a gente detecta que, em Cabo Frio, eles não são estimulados a usar máscaras e a seguir o protocolo. Foi pedida uma campanha para mostrar a importância do uso da máscara. A gente, com as informações dos leitos de hospital; da infecção se está subindo ou descendo, e da quantidade de mortos, a gente quer chegar a um ponto de harmonia em que possa nos proteger e proteja os nossos visitantes. O mote é que não existe Turismo se o morador não estiver satisfeito para receber o turista. Então, eu vou focar muito na qualidade de vida do nosso morador para que ele receba o turista de braços abertos.

Folha – O que vocês já conversaram com Bonifácio especificamente sobre o verão?

Rosa – Por enquanto, a gente está num momento de transição. No meu setor, por exemplo, eu tive muita harmonia, porque tenho uma amizade com o secretário de Esportes [Flávio Rebel] e fiquei com uma visão muito boa do atual do Turismo. Eu conheço muito o pessoal do Esporte e o pessoal do Turismo é muito inteligente e bem intencionado. Então, fica fácil. A gente vai ter que participar, logicamente. Eu estou dando muita importância a essa junção, porque o Turismo se trata de todos os assuntos: a sujeira na praia; o som alto; problemas de segurança. Vamos ter o hasteamento da Bandeira Azul. Quanto mais segurança, de balneabilidade da água, da limpeza, isso é muito importante para o Turismo. Quanto mais, melhor a gente vai receber as pessoas que vem para cá. Esse é o tom que a gente precisa, de organização na praia, de um ambiente saudável e gostoso, que a natureza nos dá. Não podemos depredar. O Bonifácio quer que a praia seja nossa sala de visitas para receber nossos visitantes e nossos moradores. 

Folha – Já há alguma reunião marcada com o Ministério Público Federal para tratar da limpeza e da organização da praia? Alguma coisa já foi combinada com a atual gestão?

Rosa – Por enquanto não, porque nosso prefeito tirou alguns dias de folga. Nós estamos trabalhando praticamente 24 horas. Estou tão ansioso que acho que estou dormindo três horas por noite. Estamos levantando tudo. Como eu sou do futebol, eu digo que vamos entrar no jogo sem aquecimento. Vamos entrar com o jogo em andamento. Então vai ser muito difícil, mas é lógico que vai ser tudo muito transparente. Acredito que até o dia 17, vamos levantar tudo e vamos andar junto com o prefeito, que está muito preocupado. Mesmo viajando, ele não perde a atenção a Cabo Frio. Ele está muito ligado e preparado. A equipe também está energizada com isso. Acho que tudo vai dar certo. Todo mundo tem que jogar esse jogo de maneira coesa, compacta, inteligente e capitaneado por José Bonifácio. 

Folha – Como você vê a questão dos meios de hospedagem que não são legalizados? É um problema em qualquer época, mas é mais preocupante em tempos de pandemia. 

Rosa – A tendência é caminhar para a hospedaria legal. É uma tradição de Cabo Frio, muitas famílias viveram no passado de aluguel de casa, mas tudo vai acabar se ajustando. Pelo que eu senti, o próprio trade e o Convention Bureau já têm o entendimento. Acho que é regulamentar tudo. E eu estou tentando a pacificação de todas as maneiras, porque sou da política de que “gentileza gera gentileza” e vai acabar tudo se harmonizando porque o Turismo de Cabo Frio tem que melhorar, não no sentido financeiro, mas de educar as pessoas que vem para cá. Tem que respeitar. Então tem um monte de ações que eu não posso adiantar agora, porque ainda vai requerer muita discussão e nós temos pouco tempo. Mas acho que vai dar tudo certo. Lógico que temos um monte de questões, como som alto, que vamos ter que mitigar os impactos disso tudo. Nesse primeiro momento, no primeiro mês e meio, vamos pegar o trem descarrilado, como eu disse. Vamos pegar muitas dificuldades, as coisas estão destruídas. O ginásio poliesportivo não tem nem luz. É lamentável que as coisas tenham chegado nesta situação. Sinto que os meus colegas de secretaria estão tendo muitas dificuldades em todos os  setores para levantar documentos. Imagina Saúde e Educação que são pastas gigantes. Mas vamos fazer uma diferença logo no começo. Na limpeza, que está precária, nas praias, que precisam de uma ajeitada muito boa. Acho que depois do dia 15, as coisas começam a deslanchar. Temos que voltar a tratar bem a nossa mãe, nossa terra amada, que está muito machucada e muito desonrada. 

Folha – Passada a alta temporada, quais as metas para o restante da gestão? Você já conversou com Bonifácio sobre o projeto do Centro de Feiras e Eventos, na Morada do Samba? 

Rosa – A gente sabe, porque acompanhou todo o programa de campanha. Ele é a nossa liderança, nosso presidente, nosso capitão do time. Então, a gente sabe mais ou menos o que ele fala. Ele vai naturalmente passar isso tudo, não demora muito, porque ainda está escolhendo o segundo escalão. Por enquanto, ele ainda está muito sozinho porque ainda está montando a equipe. E sozinho ninguém faz nada, ainda mais pelo tamanho da administração pública que a gente tem. Estamos levantando muitas coisas. Todo tipo de dificuldade, levantamento dos prédios, dos funcionários. Eu me preocupo muito com o ser humano. Quem vai jogar com a gente, quem vai ser os titulares do time, quem vamos colocar no plantel. Ainda não tem muito que dizer, mas estamos muito preocupados e nos dedicando muito.

Folha – O Zé falou muito na campanha sobre a deterioração das áreas recreativas da cidade. O que você pensa em relação às melhorias desses espaços?

Rosa – Acho que vai ser muito produtivo. Primeiro, porque a Tita (Calvet, futura secretária de Obras) é uma amiga querida de muitos anos. Uma pessoa muito competente, engenheira e uma superdesportista. Do outro lado, nos temos no Meio Ambiente, que também é ligado com as praças, o Juarez Lopes, outro desportista, um cara supercapacitado, de uma cabeça incrível. Nós estamos pensando, e já está a caminho. Alguns amigos sabendo que a gente chegou já querem adotar algumas praças, reformar por conta da inciativa privada. Parece que já tem uma lei ‘Amigos da Praça’. Temos que pegar isso e trazer a iniciativa privada para uma parceria publico-privada e, onde for mais necessário, o poder publico tem que entrar.

Folha – É um luxo para um município como Cabo Frio ter três ginásios como os do Itajuru (Alfredo Barreto); Jardim Esperança (Vivaldo Barreto) e Tamoios (João Augusto Teixeira Silva), mas todos estão deteriorados. Quais os planos para recuperação das praças esportivas?

Rosa – A gente ainda está levantando isso tudo, até porque estamos levantando também o Complexo Aracy Machado [no Itajuru], que está completamente depreciado, com o ginásio e toda a estrutura. O de Tamoios está um pouco melhor, o Correão está um pouco melhor e o do Jardim Esperança está destruído também. Vamos fazer um trabalho muito forte para terminar os quatro anos com todos os espaços reformados. Isso nós já fizemos no passado. Reformamos todas as praças, reformamos o Correão e até hoje o que o a gente reformou está lá. Passou por melhorias, mas a maior do que a gente fez está lá. Então, estamos acostumados a enfrentar esse desafio aí.  O nosso foco vai ser o Aracy Machado, que é o foco principal do esporte de Cabo Frio hoje. Vou me dedicar integralmente, junto com a minha equipe, ao Complexo Olímpico Aracy Machado, que é o sonho de várias gerações em Cabo Frio. Esse é o gol de placa. Vou tentar fazer esse gol de placa. E a outra parte, no Turismo, que eu acho é que a gente, às vezes, quer fazer uma jogada de efeito, mas não faz o passe de ladinho, que é o básico. No Turismo, vou tentar começar com o básico, e fazer dele uma questão regional. Porque hoje, com a pandemia, as pessoas estão em tiro curto. Então acho que a nossa região precisa fazer um consórcio, um conselho. Já tem até uma coisa muito evoluída, mas que não funciona muito bem na prática. Vai ter uma reunião em Búzios nos dias 15 e 16, que eu acho que já vai dar para ter um bom pontapé inicial nessa história aí. 

Folha – Pelas conversas nos últimos dias entre Zé o prefeito eleito de Búzios, Alexandre Martins, parece que a relação entre os municípios será muito estreita. 

Rosa – O Zé, com a experiência e a bagagem que ele tem, juntamente com o Alexandre; o Fábio do Pastel [prefeito eleito de São Pedro da Aldeia] e o [prefeito eleito de Arraial do Cabo] Marcelo Magno vai conseguir envolvê-los porque para tudo temos os ônus regionais. Temos que passar a ter os bônus regionais. Arraial tem o Porto; Cabo Frio tem Aeroporto Internacional; Búzios tem toda aquela estrutura. No final, eu acho que não serão apenas esses quatro municípios, mas ainda vai ampliar mais. Mas esses quatro são certos.  A gente vai ter uma conversa muito boa sobre isso. 

Folha – Como você pretende turistificar atividades esportivas em que o município tem vocação natural, como a canoa havaiana?

Rosa – Isso é muito natural porque as duas áreas andam muito juntas. Mas faltava um detalhe, que eu digo que é o básico: nós não temos um calendário turístico e esportivo. O turista quando chega a Cabo Frio não sabe onde pegar um mapa, onde estão os nossos monumentos históricos; que horas abrem. Se chegar à Praça Porto Rocha, onde está a informação turística da cidade? Aquele “i” tradicional, que tem em todos os lugares do mundo. Temos o Aloha Spirit, o Balé Internacional. Temos grandes eventos que poderiam estar previstos para o ano que vem, para daqui a dois e três anos. Porque o turista vai vir sabendo que vai ter alguma coisa na cidade, já com bastante antecedência, podendo se programar. Um exemplo bacana do Turismo regional é o Mundial de Surf de Saquarema, que normalmente acontece em maio. Então, não cabe a Cabo Frio concorrer com Saquarema nesta época. Tem é que fazer, uma semana antes, um festival de surf music para puxar essa galera que vem de fora. É essa conotação que eu quero passar na reunião de Búzios, nos dias 15 e 16.

Folha – Você tem planos de retomar a liga de futsal? 

Rosa – Com certeza. Essas ligas e entidades são autônomas e independentes do poder público. A gente tem que fomentá-los e apoiá-los. Eles fizeram muito, principalmente na minha época, porque a gente tinha liga de futsal, de handebol, de basquete, de vôlei, associação de corredores; associação de ciclistas. Temos que ser indutores e não ficar realizando coisas que o poder público tem que ficar livre. A gente pode trabalhar para atender às comunidades, as pessoas que mais necessitam desses projetos sociais. Sei que algumas dessas associações estão desorganizadas, com problemas jurídicos, que vamos contra-atacar. Estive no Sebrae e um dos pedidos que fiz é, num primeiro momento, que precisamos tentar fazer um curso ou alguma coisa virtual para ajudar os nossos abnegados, essas pessoas que fazem o esporte para as nossas comunidades, a aprenderem um pouco de organização; onde podemos pegar verba; onde podemos legalizar as situações e tocar todas as modalidades de esporte. Nós não vamos ter só bola, vamos ter remo, natação, triatlo, corrida rústica, eco corrida. Vamos fazer realmente um negócio bem diversificado, inclusive na questão paralímpica, que é muito importante para gente. Vamos atacar muito nisso aí também e na questão da integração social completa do ser humano.