Momento crítico

'Complicado' e 'arriscado', diz infectologista sobre volta de atividades nos próximos dias

Apparecida Castorina Monteiro afirma que “nenhum sistema está preparado” para a situação que se aproxima

1 MAI 2020 • POR Tomás Baggio • 12h54
Apparecida Castorina Monteiro é médica infectologista - Arquivo Pessoal

A preocupação com o colapso do sistema de saúde nos municípios do Rio é uma realidade entre profissionais de medicina. A médica infectologista Apparecida Castorina Monteiro, que atende em unidades de saúde de Cabo Frio e Arraial do Cabo, alerta para o período crítico de aumento de casos, e considera temerário que ocorra um relaxamento do isolamento social no momento em que a curva de contaminações atinge o seu ápice.

– As mudanças acontecem a todo momento. A verdade que eu te falo agora muda daqui a uma hora. Em princípio, na minha opinião, é muito complicado ter uma reabertura neste momento, um tanto arriscado. O governador de São Paulo tinha dito isso e voltou atrás rapidamente. Estamos no momento mais crítico –afirma a infectologista.

De acordo com a médica, nenhum sistema de saúde em todo o mundo, por melhor que seja, está preparado para a situação imposta pelo novo coronavírus.

– Sistema nenhum de saúde está preparado para isso. Você vê no Rio, em São Paulo... se nós aqui na região seguirmos pelo mesmo caminho, vamos ter isso (um colapso do sistema) mais tarde, mas é muito difícil não acontecer. Mesmo porque, bem ou mal, houve um isolamento por aqui, está havendo há algum tempo, e isso ajuda a minimizar o boom. É hora de continuar. Se todos adoecem ao mesmo tempo, ocorre um colapso e sistema nenhum se sustenta – argumenta Apparecida, completando:

– Países desenvolvidos, como EUA e Espanha, que têm uma estrutura muito melhor de saúde, a Inglaterra, que tem uma super estrutura, não conseguiram escapar. A única ação ainda é o isolamento social horizontal, total. Não adianta colocar grupo de risco em uma redoma, porque esse grupo vai ter contato com quem se expôs. Não funciona assim. Este é o momento de reforçar o isolamento, e só sair de casa em casos essenciais – disse ainda a médica.

Em Cabo Frio, após decreto assinado pelo prefeito Adriano Moreno (DEM), a previsão é de que o comércio passe a ter uma reabertura gradual a partir da próxima segunda-feira (4).

Pelo novo Plano Estratégico de Retomada Gradativa das Atividades Econômicas do Município de Cabo Frio, no começo da próxima semana, além do comércio considerado essencial, como supermercados, padarias e farmácias, poderão retomar as atividades as óticas; escritórios de profissionais liberais; imobiliárias e administradoras de imóveis; serviços de corretagem de imóveis e seguros; lojas de material de construção, ferragem e de equipamento de proteção individual; borracharias e oficinas mecânicas.

A médica Apparecida Castorina Monteiro ressalta, ainda, que o isolamento é o único método comprovado para evitar a contaminação pela Covid-19. Para ela, disputas sobre medicamentos que ainda estão em teste são inúteis. Ela também afirma que, como profissional de saúde, estando mais exposta ao risco, teme contrair a doença.

– Quem não teme, né? Quem não teme não é normal. Óbvio que a gente teme. É preciso tomar o máximo cuidado possível. Até existir uma vacina, não tem remédio mágico. Essa guerra ideológica em relação a medicamentos parece piada. Não existe nada, absolutamente nada, que se possa dizer que é efetivo. A estrutura do vírus, inclusive, dificulta isso. Tem os efeitos adversos, que são um complicador, então é preciso fazer todos os testes necessários. E uma vacina que pode produzir um efeito real não vai ser agora, por mais que isso esteja adiantado. Tudo indica que a gente ainda vai sofrer um pouco. As projeções dizem que o Brasil não fica livre antes do mês de setembro. São dados de projeções matemáticas, de organizações internacionais sérias, comparando com outros países – indica a especialista.

As orientações para evitar o contágio incluem, além do isolamento, o uso de máscaras e higienização constante quando for necessário sair de casa. Já o uso de luvas, segundo ela, não é indicado, pois as pessoas se sentem mais seguras e tomam menos cuidado ao tocar em objetos, e com a higienização necessária.

Apparecida demonstra preocupação em especial com as pessoas mais vulneráveis, que se encontram em condição ruim do ponto de vista econômico e de higiene.

–  O que mais assusta é que quem trouxe a doença para o Brasil foram as pessoas de maior poder aquisitivo. Mas quem mais vai morrer são as pessoas que estão em condições piores, em comunidades com espaços pequenos, sem saneamento, sem alimentação adequada, onde o estado não chega, são as que mais vão sofrer – afirma.